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Sou muito humorado. Se bem ou mal, depende da situação...

Em 1989 o HIV invadiu meu organismo e decretou minha morte em vida. Desde então, na minha recusa em morrer antes da hora, muito aconteceu. Abuso de drogas e consequentes caminhadas à beira do abismo, perda de muitos amigos e amigas, tratamentos experimentais e o rótulo de paciente terminal aos 35 quilos de idade. Ao mesmo tempo surgiu o Santo Graal, um coquetel de medicamentos que me mantém até hoje em condições de matar um leão e um tigre por dia, de dar suporte a meus pais que se tornaram idosos nesse tempo todo e de tentar contribuir com a luta contra essa epidemia que está sob controle.



Sob controle do vírus, naturalmente.



Aproveite o blog!!!



Beto Volpe



quinta-feira, 31 de maio de 2012

A homofobia sai do armário

Pessoal, segue relatório anual do Grupo Gay da Bahia que é o único levantamento dos crimes de ódio a homossexuais, travestis e lésbicas disponível no Brasil. Os dados são de estarrecer e o aprofundamento na leitura nos remete às cenas dos crimes. Terrível, vivemos um retrocesso e sabemos onde isso irá parar. Peço desculpas pela imagem, mas não há outra a ser apresentada.

Beto Volpe

Descrição da imagem: em um recipiente do IML está o corpo de um homossexual que teve sua cabeça e seus membros separados do tronco.

RELATÓRIO 2011 – GGB

O Grupo Gay da Bahia (GGB),divulgou em seu Relatório Anual de Assassinato de Homossexuais,que em 2011 Foram documentados 266 assassinatos de gays, travestis e lésbicas no Brasil, 6 a mais que em 2010, um aumento 118% nos últimos seis anos (122 em 2007). Os gays lideram os “homocídios”: 162 (60%), seguidos de 98 travestis (37%) e 7 lésbicas (3%).


A Bahia pelo sexto ano consecutivo lidera essa lista macabra: 28 homicídios, seguida de Pernambuco (25), São Paulo (24), Paraíba, Alagoas e Minas Gerais com 21 casos cada e Rio de Janeiro, 20. Roraima e Acre não registraram nenhum “homocídio”, e Distrito Federal e Amapá apenas 1.

Proporcionalmente ao número total de habitantes, os estados mais homofóbicos são Alagoas e Paraíba, cuja população conjunta representa 3,6% dos brasileiros e não obstante concentraram 16% destes crimes. O total de mortes registradas nestes dois estados nordestinos (42), é 60% superior a todos os estados da região Norte (27). Rondônia e Tocantins igualmente estão entre os estados mais perigosos: representando apenas 2% da população nacional, aí foram assassinados 5% de LGBT em 2011.

O Nordeste confirma mais esse ano ser a região mais homofóbica do país: abrigando 30% da população brasileira, registrou 46% dos LGBT assassinados. 34% dos “homocídios” ocorreram no Sudeste/Sul, embora abrigando mais da metade de nossa população (54%). Norte/Centro-Oeste, com 16% de nosso contingente demográfico, concentraram 19% dos assassinatos.

Segundo o responsável por este Relatório, o Prof. Luiz Mott, antropólogo da Universidade Federal da Bahia (UFBa) e fundador do GGB, “a subnotificação destes crimes é notória, indicando que tais números representam apenas a ponta de um iceberg de crueldade e sangue”. “Como o Governo Federal se recusa construir um banco de dados sobre crimes de ódio contra homossexuais, baseamos tal relatório em notícias de jornal e internet, que com certeza está longe de cobrir a totalidade desses sinistros” – disse Mott.

Quanto a idade, 4% das vítimas tinham menos de 18 anos ao serem assassinados, sendo o mais jovem um estudante gay paulista de 14 anos. 46% dos LGBT mortos tinham menos de 30 anos, e 11%, mais de 50 anos. A faixa etária que apresenta maior risco de assassinato, 55%, situa-se entre 20-40 anos. A vítima mais velha tinha 73 anos, um idoso de Salvador cuja família não permitiu a divulgação de seu nome nos jornais.

Os homossexuais assassinados exerciam 48 diferentes profissões, confirmando a presença do “amor que não ousava dizer o nome” em todas as ocupações e extratos sociais. Predominam as travestis profissionais do sexo, 72 das vítimas (45%), seguidas de 11 estudantes, 8 cabeleireiros/as, 7 funcionários/as públicos, 5 policiais, 3 padres e 2 pais de santo.

Quanto à “causa mortis”, repete-se a mesma tendência dos anos anteriores, confirmando pela violência extremada, trata-se efetivamente de crimes de ódio: 70 dos assassinatos foram praticados com arma de fogo. Foram registrados, ainda, 67 assassinatos por arma branca (faca, foice, machado, tesoura), 56 espancamentos (pauladas, pedradas, marretadas), 8 enforcamentos. Constam ainda afogamentos, atropelamentos, carbonização, degolamentos, empalamentos e violência sexual , asfixiamentos e torturas.

Nove das vítimas levaram mais de 10 facadas e três mais de 10 tiros. A travesti Idete, 24 anos, de Campina Grande/PB, teve sua execução filmada e divulgada na internet, levando 32 facadas. O cantor gay Omar Faria, de Paraitins/AM, aos 65 anos, foi morto com 27 facadas dentro de sua casa. Crimes de ódio!

Seriam todos esses 266 assassinatos crimes homofóbicos? O Prof.Luiz Mott é categórico em dizer que 99% destes “homocídios” contra gays têm como motivo, seja a homofobia individual (quando o assassino tem mal resolvida sua própria sexualidade), seja a homofobia cultural (que expulsa as travestis para as margens da sociedade onde a violência é mais endêmica), seja a homofobia institucional (quando os governos não garantem a segurança dos espaços frequentados pela população LGBT.”

Mott acrescenta que “quando o Movimento Negro ou Feminista divulgam suas estatísticas, não se questiona se o motivo das mortes foi racismo ou machismo, porque exigir só do movimento LGBT atestado de ódio nestes crimes hediondos? Ser travesti já é um agravante de periculosidade dentro da ótica machista!”, conclui Mott.

O Grupo Gay da Bahia (GGB) disponibiliza em seu site (www.ggb.org.br) as tabelas em que se baseia este relatório anual assim como o manual “Gay vivo não dorme com o inimigo” como estratégia para erradicar esse “homocausto”.

Somente nesses três primeiros meses de 2012 já foram documentados 104 homicídios contra homossexuais, quase o dobro do ano passado, uma morte a cada 21horas.

No ranking estadual dos assassinatos de homossexuais em 2011, segundo o GGB, o Estado de Goiás ocupa a oitava posição com o registro de 12 homicídios contra pessoas LGBT. Ainda referente ao ano de 2011, na região Centro-Oeste, Goiás é o campeão em registros de assassinatos vitimando pessoas LGBT, seguido pelos Estados de Mato Grosso (8 registros), Mato Grosso do Sul (4 registros) e o Distrito Federal (1 registro).

CLICK ABAIXO PARA VISUALIZAR OS GRÁFICOS E TABELAS:

  download - Grafico 1 


  download - Grafico 2 


        download - Grafico 3 

 

Click TABELA GERAL DE ASSASSINATOS 2012


Epidemia crescente do ódio

dados anteriores:

                                                                                       Click

Tabela geral de assassinatos 2004

Tabela geral de assassinatos 2005

Tabela geral de assassinatos 2008

Tabela geral de assassinatos 2009

Tabela geral de assassinatos 2010

 

Fonte: http://homofobiamata.wordpress.com/estatisticas/relatorios/

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Avante para o passado!


Descrição da imagem: Perfil de Gomez, com seu bigodinho de cafajeste e terno risca de giz, enlaçando Mortícia que veste preto, com seus longos cabelos negros e que segura entre ambos o cabo de uma rosa com seus espinhos e folhas, como que uma barreira para seus olhares apaixonados e bocas sedentas.

Todo mundo que se aprofunda no acompanhamento de pessoas vivendo com HIV sabe que é muito comum, entre parceiros de sorologias discordantes para o HIV, aquele que não tem o vírus insistir em transar sem camisinha com o objetivo de conversão em HIV+, para que a relação fique em pé de igualdade. Como uma demonstração de amor digna de Gomez Addams a sua amada Mortícia, é ofertada a própria saúde como prova inconteste de amor.

Ocorre que, quando amamos, não conseguimos enxergar o final da relação. Só temos a ilusão de que envelheceremos lindos, juntos, felizes e sexualmente ativos, até que termina. E, em boa parte das separações, elas não acontecem de forma consensual e amistosa, são litigiosas e muitas vezes rancorosas e vingativas. Nesse contexto, como citado na notícia abaixo, qual Magistrado pode dizer o que acontece entre quatro paredes? Quem garante que, nesse caso em especial, ela não teria sido uma dessas pessoas que fez o tal ritual de soro conversão e, tomada pelo rancor, voltou suas baterias para o ponto fraco do ex companheiro ou companheira: a sorologia para o HIV.

Mais uma vez o preconceito como o principal aliado do HIV na tentativa de deterioração da qualidade de vida do ser humano. Continua me impressionando muito a capacidade dessa epidemia se multifacetar e atingir as pessoas podendo levá-las, inclusive, para a cadeia. Não por adultério, não por agressão. Mas por ter transado sem camisinha em uma relação de amor, ainda que macabra, mas consensuada como amor.

Claro que pretendo apenas colocar o outro lado da história, porque da sociedade como um todo já parte uma série de argumentos para jogar qualquer pessoa com HIV envolvida em algum caso de transmissão entre parceiros na cadeia junto com ladrões, assassinos, traficantes e estupradores. Acho, sim, que deva existir criminalização prevista no Código Penal para casos flagrantes onde a transmissão tenha sido uma forma de ataque ou envolta em mentiras e artimanhas. Mas querer condenar toda e qualquer transmissão é mais uma forma de discriminar a pessoa vivendo com HIV e fortalecer o estigma de que somos párias e que assim devemos ser tratados.

E isso não é difícil de acontecer, somos uma sociedade que quase apedrejou uma estudante universitária por causa de sua mini saia, como se nunca tivesse existido Brigitte Bardot e Leila Diniz. 

Avante para o passado!
 
Beto Volpe

Descrição da imagem: detalhe de paredão externo de presídio cinza azulado com um grande laço vermelho de luta contra a AIDS feito de tecido afixado entre suas janelas.

Transmissão proposital de HIV é classificada como lesão corporal grave

A transmissão consciente do vírus HIV, causador da Aids, configura lesão corporal grave, delito previsto no artigo 129, parágrafo 2º, do Código Penal (CP). O entendimento é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e foi adotado no julgamento de habeas corpus contra decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF). A Turma acompanhou integralmente o voto da relatora, ministra Laurita Vaz. 

Entre abril de 2005 e outubro de 2006, um portador de HIV manteve relacionamento amoroso com a vítima. Inicialmente, nas relações sexuais, havia o uso de preservativo. Depois, essas relações passaram a ser consumadas sem proteção. Constatou-se mais tarde que a vítima adquiriu o vírus. O homem alegou que havia informado à parceira sobre sua condição de portador do HIV, mas ela negou.

O TJDF entendeu que, ao praticar sexo sem segurança, o réu assumiu o risco de contaminar sua parceria. O tribunal também considerou que, mesmo que a vítima estivesse ciente da condição do seu parceiro, a ilicitude da conduta não poderia ser excluída, pois o bem jurídico protegido (a integridade física) é indisponível. 
O réu foi condenado a dois anos de reclusão com base no artigo 129 do CP. A defesa entrou com pedido de habeas corpus no STJ, alegando que não houve consumação do crime, pois a vítima seria portadora assintomática do vírus HIV e, portanto, não estaria demonstrado o efetivo dano à incolumidade física. 

Enfermidade incurável

No seu voto, a ministra Laurita Vaz salientou que a instrução do processo indica não ter sido provado que a vítima tivesse conhecimento prévio da situação do réu, alegação que surgiu apenas em momento processual posterior. A relatora lembrou que o STJ não pode reavaliar matéria probatória no exame de habeas corpus.

A Aids, na visão da ministra Vaz, é perfeitamente enquadrada como enfermidade incurável na previsão do artigo 129 do CP, não sendo cabível a desclassificação da conduta para as sanções mais brandas no Capítulo III do mesmo código. “Em tal capítulo, não há menção a doenças incuráveis. E, na espécie, frise-se: há previsão clara no artigo 129 do mesmo estatuto de que, tratando-se de transmissão de doença incurável, a pena será de reclusão, de dois a oito anos, mais rigorosa”, destacou.

Laurita Vaz ressaltou o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Habeas Corpus 98.712, entendeu que a transmissão da Aids não era delito doloso contra a vida e excluiu a atribuição do tribunal do júri para julgar a controvérsia. Contudo, manteve a competência do juízo singular para determinar a classificação do delito. 

A relatora apontou que, no voto do ministro Ayres Britto, naquele julgamento do STF, há diversas citações doutrinárias que enquadram o delito como lesão corporal grave. “Assim, após as instâncias ordinárias concluírem que o agente tinha a intenção de transmitir doença incurável na hipótese, tenho que a capitulação do delito por elas determinadas (artigo 29, parágrafo 2º, inciso II, do CP) é correta”, completou a ministra.

Sobre o fato de a vítima não apresentar os sintomas, Laurita Vaz ponderou que isso não tem influência no resultado do processo. Asseverou que, mesmo permanecendo assintomática, a pessoa contaminada pelo HIV necessita de acompanhamento médico e de remédios que aumentem sua expectativa de vida, pois ainda não há cura para a enfermidade. 

Quanto ao sursis humanitário, a relatora esclareceu que não poderia ser concedido, pois o pedido não foi feito nas instâncias anteriores e, além disso, não há informação sobre o estado de saúde do réu para ampará-lo. 

Fonte: STJ

domingo, 20 de maio de 2012

Famoso psiquiatra pede desculpas por estudo sobre "cura" para gays

O fato foi simplesmente que ele fez tudo errado, e ao final de uma longa e revolucionária carreira, não importava com quanta frequência estivesse certo, o quão poderoso tinha sido ou o que isso significaria para seu legado.

O dr. Robert L. Spitzer, considerado por alguns como o pai da psiquiatria moderna, que completa 80 anos nesta semana, acordou recentemente às 4 horas da madrugada ciente de que tinha que fazer algo que não é natural para ele.

Ele se esforçou e andou cambaleando no escuro. Sua mesa parecia impossivelmente distante; Spitzer sofre de mal de Parkinson e tem dificuldade para caminhar, se sentar e até mesmo manter sua cabeça ereta.

Foto 4 de 16 - Grupo posa com guarda-chuva multicolor durante a marcha pelo Dia Internacional Contra a Homofobia, em Tirana, na Albânia Mais Armando Babani/EFE

A palavra que ele às vezes usa para descrever essas limitações –patéticas– é a mesma que empregou por décadas como um machado, para atacar ideias tolas, teorias vazias e estudos sem valor.

Agora, ali estava ele diante de seu computador, pronto para se retratar de um estudo que realizou, uma investigação mal concebida de 2003 que apoiava o uso da chamada terapia reparativa para “cura” da homossexualidade, voltada para pessoas fortemente motivadas a mudar.

O que dizer? A questão do casamento gay estava sacudindo novamente a política nacional. O Legislativo da Califórnia estava debatendo um projeto de lei proibindo a terapia como sendo perigosa. Um jornalista de revista que se submeteu à terapia na adolescência, o visitou recentemente em sua casa, para explicar quão miseravelmente desorientadora foi a experiência.

E ele soube posteriormente que um relatório da Organização Mundial de Saúde, divulgado na quinta-feira (17), considera a terapia “uma séria ameaça à saúde e bem-estar –até mesmo à vida– das pessoas afetadas”.

Os dedos de Spitzer tremiam sobre as teclas, não confiáveis, como se sufocassem com as palavras. E então estava feito: uma breve carta a ser publicada neste mês, na mesma revista onde o estudo original apareceu.

“Eu acredito que devo desculpas à comunidade gay”, conclui o texto.

Perturbador da paz

A ideia de estudar a terapia reparadora foi toda de Spitzer, dizem aqueles que o conhecem, um esforço de uma ortodoxia que ele mesmo ajudou a estabelecer.

No final dos anos 90 como hoje, o establishment psiquiátrico considerava a terapia sem valor. Poucos terapeutas consideravam a homossexualidade uma desordem.

Nem sempre foi assim. Até os anos 70, o manual de diagnóstico do campo classificava a homossexualidade como uma doença, a chamando de “transtorno de personalidade sociopática”. Muitos terapeutas ofereciam tratamento, incluindo os analistas freudianos que dominavam o campo na época.

Os defensores dos gays fizeram objeção furiosamente e, em 1970, um ano após os protestos de Stonewall para impedir as batidas policiais em um bar de Nova York, um grupo de manifestantes dos direitos dos gays confrontou um encontro de terapeutas comportamentais em Nova York para discutir o assunto. O encontro foi encerrado, mas não antes de um jovem professor da Universidade de Columbia sentar-se com os manifestantes para ouvir seus argumentos.

“Eu sempre fui atraído por controvérsia e o que eu ouvi fazia sentido”, disse Spitzer, em uma entrevista em sua casa na semana passada. “E eu comecei a pensar, bem, se é uma desordem mental, então o que a faz assim?”

Ele comparou a homossexualidade com outras condições definidas como transtornos, tais como depressão e dependência de álcool, e viu imediatamente que as últimas causavam angústia acentuada e dano, enquanto a homossexualidade frequentemente não.

Ele também viu uma oportunidade de fazer algo a respeito. Spitzer era na época membro de um comitê da Associação Americana de Psiquiatria, que estava ajudando a atualizar o manual de diagnóstico da área, e organizou prontamente um simpósio para discutir o lugar da homossexualidade.

A iniciativa provocou uma série de debates amargos, colocando Spitzer contra dois importantes psiquiatras influentes que não cediam. No final, a associação psiquiátrica ficou ao lado de Spitzer em 1973, decidindo remover a homossexualidade de seu manual e substituí-la pela alternativa dele, “transtorno de orientação sexual”, para identificar as pessoas cuja orientação sexual, gay ou hétero, lhes causava angústia.

Apesar da linguagem arcana, a homossexualidade não era mais um “transtorno”. Spitzer conseguiu um avanço nos direitos civis em tempo recorde.

“Eu não diria que Robert Spitzer se tornou um nome popular entre o movimento gay mais amplo, mas a retirada da homossexualidade foi amplamente celebrada como uma vitória”, disse Ronald Bayer, do Centro para História e Ética da Saúde Pública, em Columbia. “‘Não Mais Doente’ foi a manchete em alguns jornais gays.”

Em parte como resultado, Spitzer se encarregou da tarefa de atualizar o manual de diagnóstico. Juntamente com uma colega, a dra. Janet Williams, atualmente sua esposa, ele deu início ao trabalho. A um ponto ainda não amplamente apreciado, seu pensamento sobre essa única questão –a homossexualidade– provocou uma reconsideração mais ampla sobre o que é doença mental, sobre onde traçar a linha entre normal e não.

O novo manual, um calhamaço de 567 páginas lançado em 1980, se transformou em um best seller improvável, tanto nos Estados Unidos quanto no exterior. Ele estabeleceu instantaneamente o padrão para futuros manuais psiquiátricos e elevou seu principal arquiteto, então próximo dos 50 anos, ao pináculo de seu campo.

Ele era o protetor do livro, parte diretor, parte embaixador e parte clérigo intratável, rosnando ao telefone para cientistas, jornalistas e autores de políticas que considerava equivocados. Ele assumiu o papel como se tivesse nascido para ele, disseram colegas, ajudando a trazer ordem para um canto historicamente caótico da ciência.

Mas o poder tem seu próprio tipo de confinamento. Spitzer ainda podia perturbar a paz, mas não mais pelos flancos, como um rebelde. Agora ele era o establishment. E no final dos anos 90, disseram amigos, ele permanecia tão inquieto como sempre, ávido em contestar as suposições comuns.

Foi quando se deparou com outro grupo de manifestantes, no encontro anual da associação psiquiátrica em 1999: os autodescritos ex-gays. Como os manifestantes homossexuais em 1973, eles também se sentiam ultrajados por a psiquiatria estar negando a experiência deles –e qualquer terapia que pudesse ajudar.

A terapia reparativa

A terapia reparativa, às vezes chamada de terapia de “conversão” ou “reorientação sexual”, é enraizada na ideia de Freud de que as pessoas nascem bissexuais e podem se mover ao longo de um contínuo de um extremo ao outro. Alguns terapeutas nunca abandonaram a teoria e um dos principais rivais de Spitzer no debate de 1973, o dr. Charles W. Socarides, fundou uma organização chamada Associação Nacional para Pesquisa e Terapia da Homossexualidade (Narth, na sigla em inglês), no sul da Califórnia, para promovê-la.

Em 1998, a Narth formou alianças com grupos de defesa socialmente conservadores e juntos eles iniciaram uma campanha agressiva, publicando anúncios de página inteira em grandes jornais para divulgar histórias de sucesso.

“Pessoas com uma visão de mundo compartilhada basicamente se uniram e criaram seu próprio grupo de especialistas, para oferecer visões alternativas de políticas”, disse o dr. Jack Drescher, psiquiatra em Nova York e coeditor de “Ex-Gay Research: Analyzing the Spitzer Study and Its Relation to Science, Religion, Politics, and Culture”.

Para Spitzer, a pergunta científica no mínimo valia a pena ser feita: qual era o efeito da terapia, se é que havia algum? Estudos anteriores tinham sido tendenciosos e inconclusivos.

“As pessoas me diziam na época: ‘Bob, você vai arruinar sua carreira, não faça isso’”, disse Spitzer. “Mas eu não me sentia vulnerável.”

Ele recrutou 200 homens e mulheres, dos centros que realizavam a terapia, incluindo o Exodus International, com sede na Flórida, e da Narth. Ele entrevistou cada um profundamente por telefone, perguntando sobre seus impulsos sexuais, sentimentos, comportamentos antes e depois da terapia, classificando as respostas em uma escala.

Spitzer então comparou os resultados de seu questionário, antes e depois da terapia. “A maioria dos participantes relatou mudança de uma orientação predominante ou exclusivamente homossexual antes da terapia, para uma orientação predominante ou exclusivamente heterossexual no ano passado”, concluiu seu estudo.

O estudo –apresentado em um encontro de psiquiatria em 2001, antes da publicação– tornou-se imediatamente uma sensação e grupos de ex-gays o apontaram como evidência sólida de seu caso. Afinal aquele era Spitzer, o homem que sozinho removeu a homossexualidade do manual de transtornos mentais. Ninguém poderia acusá-lo de tendencioso.

Mas líderes gays o acusaram de traição e tinham suas razões.

O estudo apresentava problemas sérios. Ele se baseava no que as pessoas se lembravam de sentir anos antes –uma lembrança às vezes vaga. Ele incluía alguns defensores ex-gays, que eram politicamente ativos. E não testava uma terapia em particular; apenas metade dos participantes se tratou com terapeutas, enquanto outros trabalharam com conselheiros pastorais ou em grupos independentes de estudos da Bíblia.

Vários colegas tentaram impedir o estudo e pediram para que ele não o publicasse, disse Spitzer.

Mas altamente empenhado após todo o trabalho, ele recorreu a um amigo e ex-colaborador, o dr. Kenneth J. Zucker, psicólogo-chefe do Centro para Vício e Saúde Mental, em Toronto, e editor do “Archives of Sexual Behavior”, outra revista influente.

“Eu conhecia o Bob e a qualidade do seu trabalho, e concordei em publicá-lo”, disse Zucker em uma entrevista na semana passada.

O artigo não passou pelo habitual processo de revisão por pares, no qual especialistas anônimos avaliam o artigo antes da publicação.

“Mas eu lhe disse que o faria apenas se também publicasse os comentários” de resposta de outros cientistas para acompanhar o estudo, disse Zucker.

Esses comentários, com poucas exceções, foram impiedosos. Um citou o Código de Nuremberg de ética para condenar o estudo não apenas como falho, mas também moralmente errado.

“Nós tememos as repercussões desse estudo, incluindo o aumento do sofrimento, do preconceito e da discriminação”, concluiu um grupo de 15 pesquisadores do Instituto Psiquiátrico do Estado de Nova York, do qual Spitzer era afiliado.

Spitzer não deixou implícito no estudo que ser gay era uma opção, ou que era possível para qualquer um que quisesse mudar fazê-lo com terapia. Mas isso não impediu grupos socialmente conservadores de citarem o estudo em apoio a esses pontos, segundo Wayne Besen, diretor executivo da Truth Wins Out, uma organização sem fins lucrativos que combate o preconceito contra os gays.

Em uma ocasião, um político da Finlândia apresentou o estudo no Parlamento para argumentar contra as uniões civis, segundo Drescher.

“Precisa ser dito que quando este estudo foi mal utilizado para fins políticos, para dizer que os gays deviam ser curados –como ocorreu muitas vezes. Bob respondia imediatamente, para corrigir as percepções equivocadas”, disse Drescher, que é gay.

Mas Spitzer não conseguiu controlar a forma como seu estudo era interpretado por cada um e não conseguiu apagar o maior erro científico de todos, claramente atacado em muitos dos comentários: simplesmente perguntar para as pessoas se elas mudaram não é evidência de mudança real. As pessoas mentem, para si mesmas e para os outros. Elas mudam continuamente suas histórias, para atender suas necessidades e humores.

Resumindo, segundo quase qualquer medição, o estudo fracassou no teste do rigor científico que o próprio Spitzer foi tão importante em exigir por muitos anos.


“Ao ler esses comentários, eu sabia que era um problema, um grande problema, e um que eu não podia responder”, disse Spitzer. “Como você sabe que alguém realmente mudou?”

Reconhecimento

Foram necessários 11 anos para ele reconhecer publicamente.

Inicialmente ele se agarrou à ideia de que o estudo era exploratório, uma tentativa de levar os cientistas a pensarem duas vezes antes de descartar uma terapia de cara. Então ele se refugiou na posição de que o estudo se concentrava menos na eficácia da terapia e mais em como as pessoas tratadas com ele descreviam mudanças na orientação sexual.

“Não é um pergunta muito interessante”, ele disse. “Mas por muito tempo eu pensei que talvez não tivesse que enfrentar o problema maior, sobre a medição da mudança.”

Após se aposentar em 2003, ele permaneceu ativo em muitas frentes, mas o estudo da terapia reparativa permaneceu um elemento importante das guerras culturais e um arrependimento pessoal que não o deixava em paz. Os sintomas de Parkinson pioraram no ano passado, o esgotando física e mentalmente, tornando ainda mais difícil para ele lutar contra as dores do remorso.

E, em um dia em março, Spitzer recebeu um visitante. Gabriel Arana, um jornalista da revista “The American Prospect”, entrevistou Spitzer sobre o estudo sobre terapia reparativa. Aquela não era uma entrevista qualquer; Arana se submeteu à terapia reparativa na adolescência e o terapeuta dele recrutou o jovem para o estudo de Spitzer (Arana não participou).

“Eu perguntei a ele sobre todos os seus críticos e ele disse: ‘Eu acho que eles estão certos’”, disse Arana, que escreveu sobre suas próprias experiências no mês passado. Arana disse que a terapia reparativa acabou adiando sua autoaceitação e lhe induziu a pensamentos de suicídio. “Mas na época que fui recrutado para o estudo de Spitzer, eu era considerado uma história de sucesso. Eu teria dito que estava fazendo progressos.”

Aquilo foi o que faltava. O estudo que na época parecia uma mera nota de rodapé em uma grande vida estava se transformando em um capítulo. E precisava de um final apropriado –uma forte correção, diretamente por seu autor, não por um jornalista ou colega.

Um esboço da carta já vazou online e foi divulgado.

“Você sabe, é o único arrependimento que tenho; o único profissional”, disse Spitzer sobre o estudo, perto do final de uma longa entrevista. “E eu acho que, na história da psiquiatria, eu não creio que tenha visto um cientista escrever uma carta dizendo que os dados estavam lá, mas foram interpretados erroneamente. Que tenha admitido isso e pedido desculpas aos seus leitores.”

Ele desviou o olhar e então voltou de novo, com seus olhos grandes cheios de emoção. “Isso é alguma coisa, você não acha?”

Benedict Carey
The New York Times, em Princeton (EUA) 

Tradutor: George El Khouri Andolfato

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Prêmio Limão Palmatoadas*


Pessoal, interessante iniciativa dos amigos e amigas de Portugal, que elaboraram uma lista dos mais homofóbicos d'além mar. É uma forma contundente de dar visibilidade às ações dessas 'personalidades' e, com um toque de humor, pode ser um grande auxílio na desconstrução de seus argumentos.
* Palmatoada: pancada com palmatória, antigo método de correção infanto-juvenil nas palmas das mãos.
BV

Os mais homofóbicos em Portugal

As seguintes organizações LGBT e gay friendly, do Continente e da Região Autónoma dos Açores, Pride Azores, Free Zone informação alternativa, Diversity, Rede Positivo (grupo virtual de pessoas vivendo com HIV, do qual foi extraído este conteúdo), e Opus Gay juntaram-se para decidir no "Dia Internacional contra a Homofobia", 17 de Maio, quais as personalidades que mais se distinguiram pela negativa nestes últimos anos, até a 2012, na perseguição ideológica contra os LGBT, pela intolerância contra a Diversidade, e pela sua homofobia, contra a Cidadania. As referidas organizações são simultaneamente LGBT, gay friendly e heteros, resolveram criar por isso o "Prémio Limão-Palmatoadas", para lutarem contra estas posições diletantes na sociedade portuguesa.

A presença das gay friendy, nesta parceria pretende chamar a atenção das mulheres e homens heteros, para que assumam, como estas organizações, que esta luta é de todos, por ser pelos Direitos Humanos, e não exclusivamente dos LGBT. Quanto mais inclusivas são as sociedades, mais produtivas e mais felizes são os seus cidadãos.

Por esta razão as entidades que queremos denunciar hoje perante opinião publica portuguesa, são pessoas que o merecem devido à sua perseguição sistemática aos LGBT e à sua falta de respeito por este grupo social, que pretendem exorcizar, ou manter na invisibilidade.

Através das suas atitudes, dos seus discursos, ou escritos , demonstraram larga e consistentemente os seus preconceitos ideológicos, a sua intolerância, ignorância , e a sua pertinácia para impedir ama assunção da Cidadania plena por uma minoria social substancialmente importante e de pleno direito e que são os LGBT, e que muito sofrem, há centenas de anos por causa da homofobia e intolerância reinante nas aldeias e cidades de Portugal.

Decidimos este ano que as entidades que estão na contra corrente da Modernidade, e da Historia, e por isso devem ser denunciadas e vão receber o "Prémio Limão Palmatoadas" são as seguintes:

alt1- Em primeiro lugar o Deputado Açoriano Pedro Medina do CDS-PP-AÇORES, que se proclama sempre a favor dos açorianos, mas só os que não são LGBT! Num requerimento entregue no Parlamento Açoriano, Pedro Medina evoca pretensas razões culturais, sociais e até religiosas para criticar a disponibilidade do executivo socialista regional em patrocinar o primeiro evento regional LGBT, o primeiro Gay Pride dos Açores que se vai realizar em Setembro em S. Miguel. Pretende assim impedir a visibilidade e manter o sofrimento psicológico em que têm vivido desde sempre os lgbt açorianos.

alt 2- Isilda Pegado. Esta Deputada do PSD lançou uma petição para rever as chamadas “leis fracturantes de Sócrates”.
A presidente da Federação Portuguesa pela Vida (FPV) pretende a todo o custo lançar uma petição para que sejam revistas as chamadas "leis fracturantes" aprovadas nos últimos anos pelos ex-governos de José Sócrates. Nessa altura promoveu em Lisboa manifestações e
procissões, para convencer a opinião publica do acerto das suas posições, sem sucesso.
Em causa diz, estão as leis da reprodução artificial, interrupção voluntária da gravidez, divórcio, EDUCAÇAO SEXUAL , CASAMENTO ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO e MUDANÇA DE NOME E SEXO. Estes seis diplomas são os alvos da petição a ser lançada no congresso da FPV. “É altura de as mudar, é altura de olharmos para a destruição que elas têm causado na sociedade”, afirmou então Isilda Pegado num debate da Rádio Renascença.
É claro que pretende de qualquer maneira impedir a Cidadania dos lgbt e promover também a sua invisibilidade social.
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3- Segue-se José António Saraiva, director do conhecido semanário "Sol" autor do artigo "Homossexuais Contestatários" onde diz que "a homossexualidade é uma moda", transformando assim a orientação sexual das pessoas numa "moda", confundindo orientação sexual com "opção", ressaltando como o justo testemunho de um ser reprodutor – porque heterossexual, claro está – a tentar passar os seus preconceitos pessoais às gerações seguintes e vindouras. Esta atitude é tanto mais grave quanto se trata do director de um jornal prestigiado, e portanto difusor de ideias, que, como manda o seu código deontológico, não deveria tentar formar, mas apenas informar. Se fosse noutro país teria sido demitido, ou teria de apresentar escusas públicas, pelos disparates publicados.

4- José Marques Teixeira, psiquiatra. A 2 de Maio, num artigo de um jornal, o Presidente do Colégio de Psiquiatria da OM, José Marques Teixeira, considerava que pode ser possível dar resposta a um homossexual que pede ajuda médica para mudar de orientação sexual.
Várias organizações solicitaram ao bastonário que se pronunciasse, ao mesmo tempo que o psiquiatra Daniel Sampaio promoveu a petição que teve 780 assinaturas exigindo também uma clarificação da Direcção da Ordem e "uma tomada de posição do Colégio da Especialidade de Psiquiatria".
Do Colégio de Psiquiatria ainda não houve "tomada de posição técnica" - sob o pretexto que José Marques Teixeira falara "a título pessoal". O bastonário respondeu às organizações, por escrito, a 14 de Maio e considera que alterar a orientação sexual de "um doente não constitui uma violação ética".

Recordamos que, cientificamente, desde 1973, a homossexualidade não é considerada doença. Em Portugal a HOMOSSEXUALIDADE não é crime desde 1986 e a HOMOFOBIA é criminalizada (discursos de ódio) desde 2007.

Contudo, continuamos a assistir a discursos de ódio, que permanecem latentes como politicamente correctos na sociedade portuguesa, desinformada e formatada pelo discurso hetero-sexista, e pela herança machista dos tempos de Salazar, sempre acolitada pelas posições retrógradas, das várias religiões monoteístas.

Algumas notícias sobre esta iniciativa:

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Comitê dos EUA aprova teste de HIV feito em casa

Pelo jeito, lá como cá o importante é o diagnóstico, pouco importam as consequências. Sinceramente, não consigo ver um resultado desses sem um bom aconselhamento, especialmente em tempos de carência afetiva. Onde foram parar todos aqueles estudos que demonstravam que as circunstâncias que envolvem o momento do diagnóstico afetam positiva ou negativamente a aceitação e o desenrolar da infecção?
BV

Descrição da imagem: busto de homem jovem e careca levando as mãos ao rosto aparentando desorientação e angústia. Ao fundo, objetos desfocados repousam sobre a mesa num canto sombrio.

DO "NEW YORK TIMES"

Um comitê consultivo externo da FDA (agência que regula alimentos e medicamentos nos EUA) recomendou a aprovação de um teste de HIV que pode ser feito em casa, sem ajuda médica.

Os 17 integrantes do comitê decidiram em voto unânime que os benefícios do OraQuick superam os riscos para os consumidores. O teste segue a linha dos exames de gravidez comprados em farmácias. Mas, em vez de xixi, a pessoa usa saliva. Os resultados saem em 20 minutos.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

A César o que é de César

Descrição da imagem: moeda de prata romana com a efígie do imperador Cesar

Temos lido notícias assustadoras sobre o fechamento de diversas instituições que atuam na luta contra a AIDS. Algumas delas tradicionais, como GAPA-SP e o SOMOS de Porto Alegre, reclamam de falta de financiamento e outros tipos de apoio para continuarem seus trabalhos. É de se imaginar que organizações de menor porte e em cidades sem as características metropolitanas e progressistas das citadas capitais estejam enfrentando problemas mais sérios para sustentar suas atividades. Mas não é o que pensa o Departamento Nacional de DST/AIDS/HVs. Em uma confissão pública de incompetência em implementar a política de diagnóstico precoce ao HIV o doutor Ronaldo Hallal, falando pela Coordenação de Cuidado e Qualidade de Vida do referido departamento, propõe que as ONGs passem a realizar testes de HIV em suas dependências.

Doutor Ronaldo, não sei se é de vosso conhecimento, mas o mar não está pra peixe no mundo das ONGs/AIDS. Não temos mais esse reconhecimento popular todo, o senso comum acredita que a AIDS está sob controle e temos o melhor programa de AIDS do mundo. O mesmo senso comum também acha que as ONGs são todas umas corruptas que atuam com os políticos ladrões para roubar o dinheiro público. Ninguém mais fala de AIDS, doutor Ronaldo. Lembro de um episódio de South Park onde o personagem mais cruel, o garoto Eric Cartman, contrai o vírus HIV e organiza um evento beneficente em prol de si mesmo. Com o atraso para o início ele questiona o mestre de cerimônias sobre onde estaria Elton John, ao que o rapaz responde:

- Ele pediu para dizer que não pode vir, pois teve que ir a um evento contra o câncer. A AIDS não dá mais mídia.

E não dá mais, mesmo. Nem com o departamento no qual o doutor trabalha estamos com crédito. Há pouco mais de um ano fomos taxados de acomodados tanto pelo vosso superior doutor Dirceu Greco como pela UNAIDS através do doutor Pedro Chequer. Acaba de ser contrariada pactuação sobre os vídeos de prevenção ao público LGBT no carnaval de forma humilhante, obrigando-nos a ver imagens como essa como sendo nossa reação ao veto em pronunciamentos públicos nos ridicularizando, agora sob a chancela oficial. É tamanha a desconsideração com nosso árduo trabalho na ponta que o coordenador da área de riscos, direitos humanos e vulnerabilidades do seu departamento, doutor Ivo Brito, nos classificou de 'conservadores' e que nosso discurso é sempre político e não técnico. 

Ora ora, doutor Brito, nosso movimento sempre foi pautado pela transgressão e pioneirismo e se essas qualidades se perderam ao longo do tempo é porque fomos assumindo ações em locais ou com populações que o Estado, supostamente, não consegue atingir. Deixamos de fazer o controle social devido para que as unidades de saúde conseguissem mais do que os míseros três testes ao dia, para que exames de alta complexidade não demorassem meses para sua realização, para que houvesse mais vagas para internação, para que o fundamentalismo religioso tivesse uma oposição fortalecida. Equivocada, como foi classificada nossa reação, é a visão de movimento social que os doutores têm. Como equivocada acho que está a sociedade civil organizada em AIDS em acreditar que tem no governo federal um parceiro incondicional.

Doutor Hallal, não é a primeira vez que confrontamos nossas idéias e tenho certeza que não será a última, afinal teremos o Congresso de Prevenção logo em agosto e nossa vuvuzela está cheia de mágoas. Não pensem os doutores que ao assumirem ares de movimento social, defendendo essa proposta aos berros em uma reunião de coordenadores municipais em AIDS, nos irão convencer que a proposta não é uma terceirização da responsabilidade do Estado. Ela não passa de uma confissão de incompetência disfarçada de política pública pra ONU ver e que não leva em consideração nossa opinião e as circunstâncias que  envolvem nosso difícil dia a dia, quase tão difícil quanto conquistar reconhecimento do próprio Estado que se diz parceiro e que não consegue mais diferenciar Estado, Deus e Sociedade Civil.

A César o que é de César, a Deus o que é de Deus, às ONGs o que é das ONGs.

Beto Volpe

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Amor gouinage

Pessoal, de novo não tem nada, apenas ganhou nome. E fiquei muito feliz em saber que tem até página no FB, a qual já curti, como estou curtindo demais a idéia de não estar sozinho. Você também curte?
Beto Volpe

Descrição da imagem: close de belo casal gay com um negro de perfil mordiscando o lábio inferior de um branco que, com a mão acariciando o pescoço do parceiro, olha para nós como que dizendo: ficou nervoso? Vai pescar!

Uma nova tendência sexual cresce e ganha adeptos no Brasil. "Nova"? Bom, o tema, na verdade, é bem conhecido – mas, só há pouco tempo, foi criado um termo para identificar essa forma de prazer...
por Marcos Piovesan

A “nova” tendência sexual é, na verdade, o sexo sem penetração! Acreditem os leitores ou não, é cada vez mais comum encontrar gays que querem ter prazer entre si – mas que não envolva  o bom e velho sexo anal.

Saindo à francesa
A nomenclatura gouinage veio da França, e a palavra, na realidade, não tem uma tradução exata: na origem, está mais diretamente ligada ao sexo lésbico, já que, como dissemos, refere-se ao ato de transar sem penetração (como parte das meninas homossexuais fazem).

Entendam os leitores, entretanto, que o gouinage hoje não está relacionado somente ao sexo entre mulheres, mas a qualquer tipo de relação sem penetração. 

Esses “tipos” incluem, obviamente, o sexo oral, mas também todas as formas das chamadas preliminares, que, justamente por não haver nada entrando em nada, têm aqui um papel muito mais importante do que na transa, digamos, mais tradicional.

Chama a atenção, porém, que, mesmo assim, o termo ainda seja desconhecido de muitos gays. “Nossa, é isso que é gouinage? Olha, já faço isso há tanto tempo e não sabia que só agora deram um nome”, surpreende-se Carlos, 35 anos, de Florianópolis/SC. O mesmo espanto foi detectado em outros entrevistados para esta reportagem: não pela novidade em si, mas por já o praticarem, e somente agora ter sido rotulado...

Verdade seja dita, o próprio leitor já deve estar refletindo e se dando conta que, em algum momento de sua vida sexual, já fez gouinage: aquelas experiências em que beijos, abraços e masturbação mútua faziam com que chegássemos ao orgasmo, dispensando o sexo anal em si.

Ser gouine ou não ser?
As justificativas para dispensar a penetração, inclusive, variam entre os praticantes. Para Pedro, 19 anos, de Maringá/PR, a questão é de liberdade: “Sinto uma grande liberdade sexual, sem pressões, através do gouinage”.

“É um sexo completo”, afirma Rômulo, 24 anos, de São Paulo/SP. “Por mais que as pessoas não acreditem nisso... Seu parceiro faz carícias em você e você nele: a função de ambos é dar prazer da mesma forma um ao outro”. O assunto, porém, ainda é recente no Brasil. 

Somente agora, há pessoas se organizando em comunidades para discutir o gouinage – e parece que o interesse pela prática aumentou quando saiu uma reportagem na revista francesa Pref Mag, com o título “Ser gouine ou não ser”?

No texto da revista francesa, há algumas controvérsias. Para eles, a prática do gouinage pode estar diretamente ligada ao “sexo tântrico”. Na realidade, seriam ensinadas técnicas para que você possa aumentar o prazer sexual sem o toque de outra pessoa.

No entanto, no gouinage, é indispensável que haja o contato sexual com seu parceiro. Não se resume tudo às preliminares, no sentido estrito do termo, como muitos devem pensar. O lance é chegar ao orgasmo da mesma forma, só que sem a penetração. 

Um efeito “colateral” interessante da técnica é que, por isso mesmo, não existe a classificação de ativo, passivo ou versátil. “Descobri que gostava disso há pouco tempo, por saber que não há essa rotulação”, diz Luciano, 42 anos, de Curitiba/PR. “Já cheguei a me envolver, em baladas, com homens com quem trocava carinhos e, na hora do vamos ver, descobríamos que gostávamos do mesmo em se tratando de sexo anal... Então, optei, algumas vezes, por continuar curtindo a pessoa assim mesmo e tendo prazer da mesma forma”. 

Polêmicas
Nem tudo, porém, são flores. Há quem considere o gouinage uma forma de negar o sexo gay. Para esses, contato sexual pressupõe penetração. 

Daniel, 20 anos, de Salvador/BA, revolta-se: “Não gosto nem de penetrar e muito menos ser penetrado. Acho desconfortável, dolorido e anti-higiênico”.

Do ponto de vista médico, o gouinage pode ter lá suas vantagens. Dependendo do caso, as pessoas podem estar menos propensas a contrair doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e até mesmo se livrar do desconforto da chuca (lavagem intestinal) ou das microfissuras que, por vezes, se formam durante o ato. “Já tive até hemorragia por causa de caras que penetram com força...”, conta Jader, 32 anos, de Fortaleza/CE.

Novos adeptos?

Os praticantes do gouinage reclamam que, por ainda faltar informação, é difícil achar parceiros que curtam o mesmo. “Tenho dificuldade em encontrar alguém que curta gouinage, principalmente aqui, em Fortaleza”, relata Jader.

Ele não é o único a desabafar. “Apesar das comunidades que vemos na internet, ainda é muito difícil se relacionar com algum homem que goste de sexo sem penetração”, confirma Felipe, 35 anos, de Niterói/RJ.

Em uma pesquisa nas redes sociais, encontramos comunidades relacionadas ao assunto e que até promovem o encontro entre pessoas que curtem sexo sem penetração. No orkut, há uma com mais de 250 membros, que diz: “O gouinage é uma prática livre, que não tem códigos nem restrições (...). Chega de rótulos!! Todos temos liberdade de prazer, sem distinção e sem preferência!”. NoFacebook, há uma página sobre o assunto.

Quem sabe, num futuro próximo, torne-se mais fácil encontrar gays que não tenham vergonha de assumir o fato de não gostarem de sexo anal... Se esse for o seu caso, pode ser o momento de sair do armário!