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Sou muito humorado. Se bem ou mal, depende da situação...

Em 1989 o HIV invadiu meu organismo e decretou minha morte em vida. Desde então, na minha recusa em morrer antes da hora, muito aconteceu. Abuso de drogas e consequentes caminhadas à beira do abismo, perda de muitos amigos e amigas, tratamentos experimentais e o rótulo de paciente terminal aos 35 quilos de idade. Ao mesmo tempo surgiu o Santo Graal, um coquetel de medicamentos que me mantém até hoje em condições de matar um leão e um tigre por dia, de dar suporte a meus pais que se tornaram idosos nesse tempo todo e de tentar contribuir com a luta contra essa epidemia que está sob controle.



Sob controle do vírus, naturalmente.



Aproveite o blog!!!



Beto Volpe



sexta-feira, 19 de julho de 2013

Na 1ª reunião da Comissão de Articulação com Movimentos Sociais coordenada por Fábio Mesquita, ativistas anunciam saída do grupo enquanto não forem recebidos por Padilha

Alguns pontos me preocupam bastante. Um deles é a priorização do diagnóstico precoce. Não que isso não seja importante, mas a assistência carece do mesmo tratamento, especialmente pelas complicações do tratamento a longo prazo sendo jogadas para a assistência básica. Outra coisa que me surpreendeu foi a falta de sensibilidade do novo gestor para com os débitos do governo para com a sociedade civil, e são muitos como bem disse Jair Brandão. E não sei se estou doido, mas percebi um monte de entrelinhas no trecho: "Na avaliação de Mesquita, o Brasil vive um momento de disputa política, em que os múltiplos setores querem influenciar nas políticas públicas. “Mas isso é natural do processo democrático”, disse."
Um começo preocupante, que deve servir de alerta para o movimento de luta contra a AIDS. De volta às raízes!
Beto Volpe
 
 

19/07/2013 - 15h30

A 39ª reunião da Comissão de Articulação com Movimentos Sociais em HIV/Aids e Hepatites Virais (CAMS), a primeira sob a coordenação de Fábio Mesquita, aconteceu nesta sexta-feira, 19 de julho, em Brasília. Durante o evento, parte do movimento social de luta contra aids anunciou sua retirada temporária da Comissão até que seja marcada uma audiência com o Ministro da Saúde, Alexandre Padilha.

Representando as ONG/Aids do Sudeste do País, Arnaldo Barbosa, do Fórum de ONGs/Aids do estado de São Paulo, leu uma carta em que a instituição anunciou sua saída. Acompanharam a decisão todos os fóruns estaduais de ONGs/Aids presentes no encontro, com exceção do estado de Roraima, representante da região Norte, que vai discutir localmente a situação.

Os movimentos ligados aos Indígenas, Hepatites Virais e de Redução de Danos optaram por não aderir neste momento e ampliar um pouco mais as discussões internas para uma decisão posterior.

Fábio Mesquita disse lamentar profundamente que o movimento social corte o diálogo com o governo antes mesmo dele começar, mas que entende a decisão e respeita. “Entendemos isso como uma iniciativa que parte de vocês e não de nós”, encerrou.

Em 17 de junho, quinze ativistas e participantes da CNAIDS (Comissão Nacional de DST e Aids) - grupo que assessora o Ministério da Saúde na definição de mecanismos para o controle do HIV e coordena a produção de documentos técnicos e científicos – também assinaram uma carta aberta direcionada ao ministro Padilha, informando que não fariam mais parte da Comissão.

O protesto fazia referências aos recentes vetos da Pasta em campanhas de prevenção às DST/aids.

Novas diretrizes do Departamento

De acordo com Fábio Mesquita, entre as novas diretrizes que pretende trazer ao Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, está o estímulo ao aumento do diagnóstico de HIV. O novo diretor disse que quer resgatar as políticas de redução de danos e das hepatites virais, que em sua opinião encontram-se negligenciadas.

A expansão do diagnóstico precoce segue uma tendência mundial, ressaltou Mesquita. Entre as ideias, ele citou a realização de testes em farmácias, o que foi alvo de críticas por ativistas, que alegaram que este é um momento tenso e delicado. Para o diretor, a tensão em relação à realização do teste pode acontecer em qualquer ambiente e não é privilégio dos testes realizados em farmácias.

Quando perguntado se o aumento dos diagnósticos vai pressionar os serviços de assistência, o novo chefe do Departamento lembrou da ideia de descentralização da assistência, em que um paciente com HIV pode ser atendido por um clínico geral. “O importante é o médico ser bem treinado e capacitado, além de compromissado com o paciente”, disse. Para Mesquita, é necessário aumentar a quantidade dos serviços especializados, mas nem tudo vai ser direcionado para eles, já que parte pode ficar para a atenção básica.

Jair Brandão, da ONG Gestos, declarou ser preocupante o governo convocar a sociedade civil para comunicar as novas diretrizes, quando estas deveriam ter sido elaboradas junto ao movimento. “Além disso, o senhor chega em um momento em que há várias pendências do governo com o movimento de aids, estamos sem várias respostas”, cobrou o ativista.

O gestor respondeu a crítica alegando que as questões trazidas nesta sexta-feira são completamente emergenciais e consenso entre as demandas dos ativistas, mas que está aberto ao diálogo para a construção da política de resposta à epidemia.

“Seria irresponsabilidade da minha parte esperar seis meses para tratar dessas questões emergenciais, fora que são ações que estão em movimentos como o manifesto ‘O que nos tira o sono?’, que já são demandas de vocês. E as respostas que estamos devendo virão, só é preciso de um pouco mais de tempo, já que estou no cargo há menos de duas semanas”, defendeu-se Fábio.

Redução de danos e hepatites


Na reunião, Mesquita prometeu também revigorar a política de redução de danos entre usuários de drogas, que em sua opinião está esquecida no Departamento. “É uma população extremamente importante, não só para o HIV, mas também para a Hepatite C. Seria uma negação da minha própria história se eu não trabalhasse isso”.

O movimento de hepatites virais declarou-se esperançoso com a posse de Mesquita, que disse que a área não será mais negligenciada no Departamento. A principal crítica do movimento social foi em relação à burocracia para o acesso ao tratamento, especialmente aos medicamentos inibidores de protease. O problema foi reconhecido pelo novo diretor, que se compromissou em trabalhar nisso para aumentar o acesso ao tratamento.

Momento de disputa política

Na avaliação de Mesquita, o Brasil vive um momento de disputa política, em que os múltiplos setores querem influenciar nas políticas públicas. “Mas isso é natural do processo democrático”, disse.

“Nós vamos continuar lutando pelas diversidades e para que sejam aceitas. Mas há formas e formas de fazer campanhas. Temos que ser mais criativos com os mecanismos para colocar nas ruas as mensagens que o movimento social deseja. Não precisamos fazer necessariamente com o logo do governo, mas elas terão o apoio do governo. Isso não é recuar das responsabilidades, mas precisamos saber em que sociedade vivemos”, complementou.

Seguindo a linha de raciocínio, o gestor acha que é injusto dizer que o Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, é conservador, já que ele foi contra ações como o estatuto do nascituro e a internação compulsória de usuários de drogas. “O mesmo vale para a presidente Dilma, já que tivemos uma série de avanços em seu governo”.

Nana Soares
Agência de Notícias da AIDS

terça-feira, 16 de julho de 2013

Equívocos conceptuais no governo do PT

 

 


Pessoal, compartilho artigo de Leonardo Boff sobre desigualdade social no Brasil.
Beto Volpe
 
Descrição da imagem: a metade esquerda é foto de uma comunidade carente, separada por um muro de um prédio de alto luxo, com piscina em todos os apartamentos.
 
 
Estimo que parte das razões que levaram multidões às ruas no mes de junho tem sua origem nos equívocos conceptuais presentes nas políticas públicas do governo do PT. Não conseguindo se desvenciliar das amarras do sistema neoliberal imperante no mundo e internalizado, sob pressão, em nosso pais, os governos do PT tiveram que conceder imensos benefícios aos rentistas nacionais para sustentar a política econômica e ainda realizar alguma distribuição de renda, via políticas sociais, aos milhões de filhos da pobreza.

O Atlas da exclusão social – os ricos no Brasil(Cortez, 2004) embora seja de alguns anos atrás, mantem sua validade, como o mostrou o pesquisador Marcio Pochmann (O pais dos desiguais, Le Monde Diplomatique, outubro 2007). Passando por todos os ciclos econômicos, o nível de concentração de riqueza, até a financeirização atual, se manteve praticamente inalterado. São 5 mil famílias extensas que detem 45% da renda e da riqueza nacionais. São elas, via bancos, que emprestam ao governo; segundo os dados de 2013, recebem anualmente 110 bilhões de reais em juros. Para os projetos sociais (bolsa família e outros) são destinados apenas cerca de 50 bilhões. São os restos para os considerados o resto.

Em razão desta perversa distribuição de renda, comparecemos como um dos países mais desiguais do mundo. Vale dizer, como um dos mais injustos, o que torna nossa democracia extremamente frágil e quase farsesca. O que sustenta a democracia é a igualdade, a equidade e a desmontagem dos privilégios.

No Brasil se fez até agora apenas distribuição desigual de renda, mesmo nos governos do PT. Quer dizer, não se mexeu na estrutura da concentração da renda. O que precisamos, urgentemente, se quisermos mudar a face social do Brasil, é introduzir uma redistribuição que implica mexer nos mecanismos de apropriação de renda. Concretamente significa: tirar de quem tem demais e repassar para quem tem de menos. Ora, isso nunca foi feito. Os detentores do ter, do poder, do saber e da comunicação social conseguiram sempre impedir esta revolução básica, sem a qual manteremos indefinidamente vastas porções da população à margem das conquistas modernas. O sistema politico acaba servindo a seus interesses. Por isso, em seu tempo, repetia com frequência Darcy Ribeiro que nós temos uma das elites mais opulentas, antisociais e conservadoras do mundo.

Os grandes projetos governamentais destinam porções significativas do orçamento para os projetos que as beneficiam e as enriquecem ainda mais: estradas, hidrelétricas, portos, aeroportos, incentivos fiscais, empréstimos com juros irrisórios do BNDES. A isso se chama crescimento econômico, medido pelo PIB que deve se equacionar com a inflação, com as taxas de juros e o câmbio. Priviligia-se o agronegócio exportador que traz dólares à agroecologia, à economia familiar e solidária que produzem 60% daquilo que comemos.

O que as multidões da rua estão reclamando é: desenvolvimento em primeiro lugar e a seu serviço o crescimento (PIB). Crescimento é material. Desenvolvimento é humano. Signfica mais educação, mais hospitais de qualidade, mais saneamento básico, melhor transporte coletivo, mais segurança, mais acesso à cultura e ao lazer. Em outras palavras: mais condições de viver minimamente feliz, como humanos e cidadãos e não como meros consumidores passivos de bens postos no mercado. Em vez de grandes estádios cujas entradas aos jogos são em grande parte proibitivas para o povo, mais hospitais, mais escolas, mais centros técnicos, mais cultura, mais inserção no mundo digital da comunicação.

O crescimento deve ser orientado para o desenvolvimento humano e social. Se não se alinhar a esta lógica, o governo se vê condenado a ser mais o gestor dos negócios do que o cuidador da vida de seu povo, das condições de sua alegria de viver e de sua admirada criatividade cultural.

As ruas estão gritando por um Brasil de gente e não de negócios e de negociatas; por uma sociedade menos malvada devido às desigualdades gritantes; por relações sociais transparentes e menos escusas que escondem a praga da corrupção; por uma democracia onde o povo é chamado a discutir e a decidir junto com seus representantes o que é melhor para o país.

Os gritos são por humanidade, por dignidade, por respeito ao tempo de vida das pessoas para que não seja gasto em horas perdidas nos péssimos transportes coletivos mas liberado para o convívio com a família ou para o lazer. Parecem dizer: “recusamos ser apenas animais famintos que gritam por pão; somos humanos, portadores de espírito e de cordialidade que gritamos por beleza; só unindo pão com beleza viveremos em paz, sem violência, com humor e sentido lúdico e encantado da vida”. O governo precisa dar esta virada.
 
Leonardo Boff

Alguém tem um balde?

Pessoal, com muito prazer compartilho texto de minha querida amiga Jackie Goulart que, além de sua qualidade, espelha exatamente como eu me sinto.
Beto Volpe
 
Descrição da imagem: estrela vermelha símbolo do Partido dos Trabalhadores rachada pelo mau uso que está sendo feito dela.
 

 
É de dar náuseas, mesmo.

Desde a campanha do Lula em 2002 essa imundície já se alinhavava. Boa parte da militância petista ali já começou a perder o respeito por essa direção do PT e pelo próprio Lula .
Mas sempre foi uma crítica muito diferente da crítica da direita. Aí está tudo o que essa esquerda previa: alianças podres, desmobilização da base e avanço da direita.

Que isso não se confunda com perder o respeito pela legitimidade dos movimentos sociais e das lutas de tantos anos que foram mais que legítimas, mudaram definitivamente esse país, que é o que uma direita covarde, que estava no armário e que, com o colchão macio da grande imprensa de repente sai histericamente berrando contra todos os avanços que o PT significou para um país inteiro.

E não falo dos avanços econômicos. São as liberdades que a classe trabalhadora conquistou na porrada e das quais agora todos desfrutam . Foram estas lutas que fazem do Brasil hoje um país onde o cidadão tem o direito de se manifestar.Mas ideologias fascistas, neo-nazistas e militaristas são excrementos do obscurantismo que a humanidade tem que eliminar definitivamente. Liberdade de escravizar, orpimir e explorar não é liberdade, é "privilégio" do qual se servirá uma minoria.

Então, viva o PT de lutas, que ainda existe mesmo dentro do PT atual, lutando incansavelmente contra uma direção traidora e reformista.

Mas é por essas e tantas outras, chorando com as evangélicas - SANTO DIO!!!!!!!! - por essas alianças PODRES que esse governo já não nos representa há muito tempo.

Ok, esse governo já não representa a sua antiga militância, que foi olimpicamente abandonada, não representa essa nova geração que deseja muito mais do seu país e não representa a direita que tem profundo e histórico pavor da classe trabalhadora.

E depois esta senhora arrogante, que em nome de uma governabilidade e em nome de dar uma maquiadinha e uma sobrevida a um sistema cruel e corrupto, queixa-se de estar sendo apunhalada pelos aliados. Queixa-se de solidão no poder. Ela esperava o quê? Esse PT esperava o que? Virar as costas para sua militância e ter o ombro amigo da burguesia mais canalha para consolo? O Lula em sua campanha e depois, em seus dois mandatos, costurou as alianças e essa senhora tecnocrata aprofundou essas alianças. Vira as costas para o genocídio dos indígenas no MS, para o drama dos povos do alto xingu, para Snowden, e vai chorar com as evangélicas degeneradas. Essa merda não me representa. Vai pros cornos, Dona Dilma.

Mas vá pros cornos também a direita que sai do armário buscando ídolos tipo barbosão farsante, Obama belicista e sem coluna vertebral, e toda essa imundície.

Vou ali vomitar um pouquinho e já volto.
 
Jackie Goulart
Florianópolis/SC

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Poderosa demais

 

O Desembargador Sidney ressucitou a figura da Amélia, criada por Mário Lago, e que era mulher de verdade. Pois, segundo seu entendimento, Luana Piovani não seria 'oprimida e subjugada' o bastante para ter direito à proteção da Lei Maria da Penha. Brilhante artigo da antropóloga Débora Diniz.
 
Beto Volpe

 

Luana Piovani é uma atriz. E, ainda, uma mãe bonita, jovem e famosa. O desembargador Sidney Rosa da Silva preferiu descrevê-la como uma personagem na sentença em que negou o pedido de proteção contra o ator Dado Dolabella. O papel foi traçado como quem escreve uma novela: nele, Piovani seria uma mulher “nunca oprimida e subjugada aos caprichos do homem”. Como mulher poderosa, parece que sua ação penal desafiou não só seu ex-companheiro, mas também o representante da Justiça, que considerou não ser aplicável a Lei Maria da Penha a mulheres como ela. Não é a primeira vez que a atriz se vê confrontada com essa negação do feminino ao apresentar-se como vítima na vida real. Em uma recente controvérsia em sua conta no Twitter, um dos fãs de Dolabella teria dito “homem de verdade não bate em mulher de verdade”. “Verdade” era uma ironia à alegação de Luana de que teria sido vítima de violência de gênero. Só mulheres de verdade poderiam ser protegidas pela Lei Maria da Penha, disseram os novos especialistas em direito penal. Se há uma verdade nessa controvérsia, é que a lei não impõe condicionalidades às mulheres: todas devem ser igualmente protegidas.
Não sei bem o que seria uma mulher de verdade, mas me esforçarei por interpretar os rastros deixados pela sentença. A discussão não é a anatomia de Luana, mas suas performances de gênero, como diriam algumas feministas. A ação penal de 2008 acusa Dolabella de tê-la agredido em uma boate; entre os dois haveria ainda Esmeralda de Souza, a camareira também agredida por ter se lançado para proteger Luana. Há imagens da cena, o que retira da discussão a pergunta sobre a verdade da violência. O que resta é saber como qualificar Luana: uma vítima sem gênero para o direito penal ou uma mulher de verdade para efeitos da Lei Maria da Penha? A decisão do desembargador, com uma verve de especialista em desigualdade de gênero, foi clara: “O campo de atuação da respectiva lei está traçado pelo binômio hipossuficiência e vulnerabilidade”. O sentido dicionarizado da palavra “binômio” deixa a classificação de mulher de verdade ainda mais curiosa: “Nome científico composto por dois nomes; um substantivo que designa o gênero e um adjetivo que designa a espécie”.
Sob o risco de me equivocar na ordem criativa do desembargador, imagino que o substantivo seja “hipossuficiência”, e o adjetivo, “vulnerável”. As mulheres como gênero humano teriam que ser pobres e dependentes dos homens. Luana provoca essa descrição do feminino, pois é rica e poderosa. Como espécie desse gênero, teria ainda que ser vulnerável. Vulnerável é daqueles adjetivos multiuso: descrevem tudo e todas, ao mesmo tempo que são escorregadios. No campo dos estudos de gênero, vulnerabilidade é a condição do feminino em sociedades com tramas diversas de patriarcado. Luana pode ser rica, mas seu corpo é vulnerável à dominação masculina. Não é à toa que sofreu agressões. Sua independência não foi capaz de blindar o seu corpo a quem crê poder discipliná-la pela violência. Parece-me ser esse o ponto esquecido pela equivocada sociologia de gênero da sentença: Luana subverteu o status de subalternidade do feminino, mas não emudeceu a ordem política que a reduz a um ser da espécie vulnerável.
Mas o conteúdo da decisão judicial prossegue na enviesada sociologia de gênero que fundamentaria a interpretação da Lei Maria da Penha. Seria preciso ainda que o ato violento tivesse ocorrido em âmbito doméstico e por alguém em relação de afetividade estável. A agressão se deu em uma boate, um espaço ambíguo para a moral que persegue as mulheres de verdade; além disso, Luana e Dolabella não viviam uma relação estável, mas de afetividade ocasional. Ora, a lei não exige nem casamento nem tampouco casa como condicionantes para sua aplicação. Essa perturbação interpretativa provocada pela figura de Luana não deve ser entendida como um curto-circuito isolado, mas como um indicador do perfil de quais seriam as mulheres enquadradas no qualificador de vítimas: somente aquelas pobres, dependentes e subjugadas à casa.
As mulheres são diferentes entre si. Muitas delas são representantes do gênero hipossuficiente, mas todas são da espécie vulnerável. Luana é rica, bonita e famosa, mas nem por isso conseguiu escapar da perversidade da violência de gênero. Ela foi agredida por um homem de suas relações de intimidade e afeto – duas variáveis esquecidas pelo desembargador, que anuncia que o uso universal da Lei Maria da Penha inviabilizaria os Juizados de Violência Doméstica e Familiar. Não sei como proteger Luana causaria tamanha catástrofe, pois é exatamente pelo rosto famoso e de mulher emancipada que é possível escandalizar a persistência da violência de homens contra mulheres. Ao contrário do que imagina o desembargador, precisamos de mulheres ricas e famosas que denunciem quanto a vulnerabilidade do feminino não depende apenas da classe social, mas da espécie que representamos.
*DEBORA DINIZ É ANTROPÓLOGA, PROFESSORA DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA E PESQUISADORA DA ANIS – INSTITUTO DE BIOÉTICA, DIREITOS HUMANOS E GÊNERO
 

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Por uma nova resposta a epidemia

Pessoal, compartilho com vocês excelente e preciso artigo do ativista Mário Scheffer, de São Paulo. Subscrevo cada colocação.
Beto Volpe

Descrição da imagem: um grupo de ativistas, punhos cerrados para cima, alguns acorrentados, outros segurando uma faixa e todos, sem exceção, indignados com alguma mazela governamental.


A derrocada do programa brasileiro de combate à aids parece reproduzir, em menor escala, o quadro de descontentamento que assola a conjuntura atual do país. A combinação de falta de diálogo com a sociedade civil, perda de capacidade técnica, baixo investimento, desconexão com a realidade da epidemia e decisões verticais de cunho conservador, imprimiu retrocessos que exigem agora novos rumos para a política.

Desaguadouro de um processo conturbado e traumático, o início da nova gestão à frente do Departamento Nacional de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde pode ser visto como oportunidade de retomada do debate franco, desde que inclua todos aqueles que têm expressado críticas e apontado soluções para a crise instalada.

Acelerou nos últimos dois anos a corrosão de pilares que davam sustentação à resposta brasileira à aids. Veja-se o menosprezo ao papel das ONGs, a subversão dos recursos descentralizados e a contaminação do Ministério da Saúde pelo fundamentalismo religioso, visando ganhos eleitorais e supostas garantias de governabilidade.

Por decisão política, a aids no Brasil deixou de ser um problema de saúde pública enfrentado no terreno da excepcionalidade. Nossa resposta no passado foi exemplar não só porque a doença em si era excepcional, pela catástrofe que representou, mas também pela existência do SUS e porque foi extraordinária a mobilização social que a epidemia suscitou. Esse movimento inédito na saúde influenciou por um bom tempo as reações dos poderes públicos, o financiamento, a conquista de marcos legais, a dotação dos programas de competência técnica, a valorização da sociedade civil e da academia na construção compartilhada e no acompanhamento das políticas.

O isolamento político do programa nacional– o que também é percebido em vários estados e municípios ¬ – , a tentativa de desqualificação de aliados históricos e o descolamento entre a ação governamental e a epidemia real são sintomas do desvio, nos últimos tempos, tanto da noção de urgência sanitária quanto do imperativo da ação coletiva, fundamentos que forjaram a trajetória do combate à aids no país.

Mas como retomar uma resposta vigorosa diante da epidemia que se banalizou e da política que se acovardou?

Primeiro, denunciando a paralisia que não se justifica do ponto de vista epidemiológico nem social, pois as mortes e as novas infecções só aumentam no Brasil e os contextos de vulnerabilidade que impactam na propagação do HIV estão longe de serem superados.

O segundo passo é romper com a atual vulnerabilidade programática da resposta brasileira à aids. Não podemos admitir a continuidade dos retrocessos num momento histórico internacional extremamente mobilizador.

Justamente quando o horizonte acena com a possibilidade de controle da epidemia a escalas jamais imagináveis, quando o mundo passa a pronunciar palavras como cura, erradicação, nível zero de infecções, conquista de uma geração livre da aids, o Brasil perde sua capacidade de inovar. Com a política apequenada, o cavalo passa selado e perdemos a oportunidade concreta de virar o jogo contra a epidemia.

Nossa história de lutas e nosso patrimônio coletivo nos permitem tirar o olho do retrovisor. Além do acesso aos antirretrovirais, a mais emblemática das conquistas, avançamos muito. O Brasil soube conjugar o combate à aids com a promoção dos direitos humanos, aprendeu que a prevenção requer respeito às escolhas individuais e a compreensão das vulnerabilidades , favoreceu uma tomada de consciência coletiva sobre a aids, combateu o estigma, embora persista em vários níveis a discriminação, ampliou o uso de preservativos e não teve receio de encarar temas tabus, como o sexo seguro e a redução de danos.

Os erros, porém, não foram menores que os acertos. É fruto da má política o fato de a aids dar sinais de recrudescimento em várias regiões, em capitais, em grandes áreas urbanas e em populações vulneráveis. Não é providência do destino encontrar, em cada seis homossexuais na cidade de São Paulo, um infectado pelo HIV. Deve ser motivo de vergonha nacional a persistência da transmissão vertical do HIV, que já poderia ter sido eliminada no Brasil.
Torna-se incompreensível a insistência numa prevenção generalizada que não dá conta do perfil nacional de uma epidemia concentrada. O diagnóstico tardio e a demora entre o teste positivo e o início do tratamento são violações correntes aos direitos dos cidadãos que vivem com HIV.
Enquanto campanhas de testagem em aglomerações visam a promoção de gestores, o teste rápido não está disponível em tempo integral nos serviços especializados e não chega às pessoas mais expostas ao HIV.

Falta transparência nas decisões que envolvem a estratégica produção nacional e formação de preços dos antirretrovirais. O Brasil ainda não garante a livre decisão dos cidadãos sobre todas as opções disponíveis e cientificamente validadas de prevenção, incluindo os métodos tradicionais mas também o acesso facilitado ao teste, o tratamento na hora certa e o uso de antirretrovirais antes ou depois do risco de infecção.

Para a construção de uma nova política, para a superação do modelo esgotado, a hora é de reconhecer os fracassos e de apostar no conhecimento acumulado e nas ferramentas disponíveis, aumentando os recursos e conjugando os esforços dos governos, serviços, profissionais, academia, ONGs e pessoas que vivem com HIV.

Da nova gestão do programa nacional, espera-se que assuma a real dimensão de uma epidemia em crescimento, abolindo de vez a divulgação seletiva de dados epidemiológicos e a censura às campanhas de prevenção. Que exerça seu papel de articulador da retaguarda assistencial, que degrada a olhos vistos. Reflexo do subfinanciamento e da gestão cada vez mais privatizada do Sistema Único de Saúde, é baixa a qualidade dos serviços municipais e estaduais que atendem HIV e aids, caóticos e supelotados, que não valorizam nem aderem profissionais qualificados.

Não ocorrerão avanços significativos sem o reconhecimento da crise vivida pelas ONGs, sem dar alternativas para a asfixia gerada pelo atual modelo de financiamento. O pluralismo das respostas da sociedade civil, marca do programa brasileiro, vem sendo aniqulado, pois muitas ONGs fecharam as portas ou abandonaram serviços e ações indispensáveis ao ativismo, à prevenção e à defesa de direitos.

É inadiável a convocação do ativismo, da epidemiologia, da vigilância, da assistência e das ciências sociais para que forneçam uma nova direção técnica para a prevenção, adaptada a diferentes pessoas e populações, incorporando as possibilidades de escolhas. Que seja produzido um inédito “consenso nacional de prevenção em HIV e aids” e que sejam perseguidas metas ousadas, como o alcance de meio milhão de brasileiros em tratamento com antirretrovirais.

Que os gritos das ruas sirvam de inspiração também para as mudanças no combate à aids, que o Brasil retome sua posição perdida de vanguarda, capaz de tirar do lugar indicadores estacionados, de alterar radicalmente a dinâmica da epidemia da aids, promovendo os direitos de cidadania das populações vulneráveis e das pessoas que vivem com HIV, reduzindo o número de adoecimentos, de mortes e de novas infecções.

Mário Scheffer é membro do Grupo Pela Vidda-SP e professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP
E-mail: mscheffer@usp.br

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Nos EUA, transplante de células-tronco pode ter curado dois pacientes com HIV

 

Galera, o que a ciência convencional afirma ser impossível nos próximos 20 anos, as novas tecnologias provam o contrário e nos trazem maravilhas como essa.
Viva a Cura!
Viva a Vida!
Beto Volpe
 
Imagem do vírus HIV na corrente sanguínea: transplante de células-tronco pode ter curado dois pacientes infectados nos EUA, mas ainda não é possível confirmar que a cura realmente ocorreu
 
Um transplante de células-tronco parece ter eliminado o vírus HIV em dois homens infectados e que há tempos faziam uso de medicamentos para controlar a doença. O transplante, junto à quimioterapia, foi realizado em Boston, Estados Unidos, após ambos os pacientes serem diagnosticados com linfoma, um tipo de câncer de sangue. Depois do procedimento, os médicos não conseguiram encontrar nenhuma evidência de que o HIV ainda estivesse presente no corpo desses homens. O caso dos pacientes foi anunciado nesta quarta-feira durante uma conferência da Sociedade Internacional de Aids, na Malásia.
 
Um dos transplantes foi realizado há cinco anos e o outro, há três anos. Segundo Timothy Henrich, médico da Faculdade de Medicina da Universidade Harvard e do Hospital Brigham and Women’s, Estados Unidos, que participou do caso, o primeiro paciente está livre dos antirretrovirais há 15 semanas e o segundo, há sete semanas. Ele acredita que ainda é cedo, porém, para dizer com certeza que o vírus foi definitivamente eliminado do organismo dos pacientes. A confirmação da cura só poderá ser obtida após os pacientes serem acompanhados por ao menos um ano, já que o vírus pode estar "escondido" no corpo.
 
Os médicos haviam relatado o caso desses homens pela primeira vez em julho do ano passado. Na época, o tratamento com células-tronco já havia sido feito, os pacientes já não apresentavam níveis detectáveis de HIV na corrente sanguínea, mas eles ainda tomavam antirretrovirais para controlar a infecção. Apesar dos resultados positivos, os especialistas não veem a terapia com células-tronco como uma forma viável de tratar absolutamente todos os pacientes infectados pelo vírus da aids, já que tal tratamento é muito caro e complexo. “Porém, esses casos podem nos levar a novas abordagens para tratar e até a erradicar o HIV”, disse, em comunicado, Kevin Robert Frost, diretor da Fundação para Pesquisa em Aids (amFar).
 
O paciente de Berlim — No fim de 2010, o americano Timothy Ray Brown, até então infectado pelo vírus HIV, deixou de apresentar o vírus no sangue depois de se submeter a um transplante de medula, realizado para tratar uma leucemia. O médico Gero Huetter selecionou um doador que, além de compatível com Brown, apresentava uma mutação do CCR5, que é a proteína que permite a entrada HIV nas células de defesa do nosso organismo. Sem ela, não há como o vírus infectar uma pessoa. Três anos após o procedimento, Brown deixou de apresentar o vírus no sangue, sem mesmo utilizar o coquetel antirretroviral. A notícia chamou a atenção de todos, mas os médicos ainda não consideram realizar transplante de medula em pacientes soropositivos uma vez que vez que o procedimento é muito arriscado.
Os novos casos apresentados nesta quarta-feira, porém, possuem diferenças em relação à história de Brown — uma delas é o fato de os dois homens não terem recebido células-tronco com a mutação da proteína CCR5. Se esses dois homens de Boston se mantiverem saudáveis, eles serão o terceiro e o quarto paciente no mundo a serem curados do HIV. O primeiro foi Brown e o segundo, uma criança de Mississippi que foi submetida à terapia antirretroviral logo após seu nascimento. “O doutor Henrich está traçando um novo caminho para a pesquisa em erradicação do HIV. Independentemente do resultado, nós aprendemos mais sobre o que é preciso para curar o HIV”, disse, em comunicado, Rowena Johnston, vice-presidente e diretora de pesquisas da amFar.
 
Fonte: Veja online

Aprovado pelo Senado, Ato Médico terá impacto no SUS

Descrição da imagem: carimbo circular em vermelho com os dizeres: "A saúde pública adverte: o ato médico faz mal à saúde."
 
 
Se sancionado pela presidente Dilma Rousseff da forma como aprovado pelo Congresso, o projeto de lei apelidado de Ato Médico deverá ter impacto na rede pública de saúde. E ele pode ser negativo, teme o Cofen (Conselho Federal de Enfermagem).
 
O texto foi aprovado no final da noite de terça-feira (18) pelo Senado e prevê a regulamentação da profissão do médico, estabelecendo atos que são privativos da categoria e outros que podem ser realizados por outros profissionais. Para o Cofen, atos praticados cotidianamente pela enfermagem na rede pública de saúde passarão a ser proibidos. Por exemplo, o diagnóstico de doenças como hanseníase, malária, DSTs, tuberculose e a prescrição de medicamentos para tratá-las --sempre seguindo protocolos de atendimento do Ministério da Saúde.
"Pedir exames para gestante, por exemplo. A maior parte quem faz é o enfermeiro. Como vai ser isso? E o acompanhamento dos pacientes com hanseníase, tuberculose, Aids? O próprio Ministério da Saúde dá curso para os enfermeiros fazerem o diagnóstico onde não há médico", protesta Amaury Gonzaga, do Cofen. Gonzaga acredita, ainda, que o Ato Médico impedirá que a acupuntura seja praticada por não médicos, ao definir que é ato privativo do médico a invasão da pele para punção, entre outros procedimentos. "O que o projeto quer dizer? Só quem pode mexer da pele para baixo é o médico. Faço acupuntura há 26 anos no SUS", diz o enfermeiro. Gonzaga diz que buscará a Justiça, de forma preventiva, para garantir a continuidade do seu trabalho, caso o texto seja sancionado por Dilma. Para o Cofen, haverá muita judicialização, que pode abarcar inclusive os direitos de enfermeiras realizarem o parto normal.
 
O CFP (Conselho Federal de Psicologia) também vê prejuízos para a categoria. Humberto Verona, presidente da entidade, entende que o Ato Médico impede que psicólogos identifiquem sintomas de doenças como depressão e transtornos. "Por exemplo, num quadro depressivo há uma série de alterações no funcionamento da pessoa. No diagnóstico psicológico, o psicólogo não vai poder falar dessas alterações, porque seria fazer um diagnóstico. Como um profissional não vai poder fazer o nexo com o transtorno?", diz. Para respaldar a categoria, o CFP pretende editar uma resolução definindo os termos do diagnóstico psicológico --como feito hoje, antes da sanção do Ato Médico.
 
Questionado sobre os impactos do projeto nos programas públicos de saúde, o ministro Alexandre Padilha (Saúde) afirmou que sua pasta inda precisa analisar o texto final aprovado pelo Congresso --ainda não disponibilizado. "O governo vai analisar o texto final aprovado de forma que se valorize a profissão médica. Mas é muito importante manter o conceito de equipes multiprofissionais. Todos nós aprendemos, ao longo dos anos, a importância de uma equipe multiprofissional. Áreas como nutrição, psicologia, fisioterapia, terapia ocupacional, enfermeiros têm um papel muito grande no cuidado com o paciente", disse o ministro nesta quarta-feira (19). Segundo a Folha apurou, ainda não há clareza no governo sobre os impactos do projeto e a eventual necessidade de vetos pela presidente Dilma Rousseff.
 
MÉDICOS
O próprio CFM (Conselho Federal de Medicina), que respalda o Ato Médico, entende que haverá mudanças da rede pública de saúde, com a necessidade da presença de médicos nas equipes, para que façam o primeiro diagnóstico e a prescrição dos medicamentos. "Hanseníase, tuberculose, hipertensão são todos programas que devem ser cuidados por uma equipe. Defendemos o que a lei agora prevê: que o diagnóstico e a prescrição sejam feitos inicialmente pelo médico. Mas o enfermeiro pode repetir os remédios prescritos e pedir exames", defendeu Roberto D'Ávila, presidente do CFM.
 
O conselho garante que o texto não abarca a realização de acupuntura ou tatuagem e diz que, em casos de emergência, outros profissionais devem oferecer os cuidados ao paciente --o que não retiraria do gestor uma eventual responsabilização, aponta a entidade. "Não vai haver uma caça às bruxas", diz D'Ávila. "Mas vamos exigir que toda equipe tenha um médico." O conselho afirma que pretende reunir os demais conselhos profissionais para discutir o cenário da saúde.
 
JOHANNA NUBLAT
GABRIELA GUERREIRO

DE BRASÍLIA
Folha de São Paulo - 19/06/13