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Sou muito humorado. Se bem ou mal, depende da situação...

Em 1989 o HIV invadiu meu organismo e decretou minha morte em vida. Desde então, na minha recusa em morrer antes da hora, muito aconteceu. Abuso de drogas e consequentes caminhadas à beira do abismo, perda de muitos amigos e amigas, tratamentos experimentais e o rótulo de paciente terminal aos 35 quilos de idade. Ao mesmo tempo surgiu o Santo Graal, um coquetel de medicamentos que me mantém até hoje em condições de matar um leão e um tigre por dia, de dar suporte a meus pais que se tornaram idosos nesse tempo todo e de tentar contribuir com a luta contra essa epidemia que está sob controle.



Sob controle do vírus, naturalmente.



Aproveite o blog!!!



Beto Volpe



quinta-feira, 28 de abril de 2011

PELO DIREITO À CURA! Publicado em 27/07/2010

Muitas pessoas têm me perguntado, ultimamente, sobre a cura da AIDS. Decidi então republicar este artigo que originalmente o fôra em http://www.aidsedeficiencia2010.blogspot.com/



Descrição da imagem: duas mãos junas em conchinha ofertando um átomo enloouquecido.

A vuvuzela brilhou no país da valsa, depois de roubar a cena na terra do samba. Lá, como cá, ela confirmou aos governos e às agências internacionais que acertaram em cheio na escolha dos temas. ‘Viver Direitos’, no recente Congresso de Prevenção em Brasília, e ‘Direitos Aqui e Agora’, na recém realizada Conferência Internacional de AIDS em Viena, demonstraram uma grande sintonia entre a estratégia brasileira e os objetivos mundiais no enfrentamento è epidemia e que grandes avanços foram feitos, mas ainda falta muito para suprir o básico. Porém, uma vez mais, a virologista Françoise Barré-Sinoussi se destacou ao coordenar uma discussão especial durante a Conferência de Viena, voltando os holofotes para um campo de pesquisas desprezado depois da descoberta do coquetel: a Cura da AIDS. Um Santo Graal esquecido até mesmo pela maioria de nós, por maior que seja nosso desejo de que em um belo dia tudo isso acabe.


Desde que Sinoussi e a equipe de Luc Montagnier isolaram o HIV nos primórdios dos tempos, muito se avançou na ciência e nas ações de enfrentamento à epidemia. No início era o caos, pois até nossos médicos possuíam grandes interrogações em seus olhares. Uma descoberta terapêutica aqui, uma ONG acolá e uma fundamental bandeira: O MUNDO TEM PRESSA NA CURA DA AIDS! Não era possível para a humanidade conviver com uma enfermidade tão sorrateira e cruel que ameaçava não somente aos então rotulados grupos de risco, mas à estabilidade econômica mundial. Era uma bandeira única, todos tinham pressa na cura da AIDS porque ela assustava todo o mundo, desde quem vivia com HIV até as mais altas instâncias das Nações Unidas.

“AIDS: um mundo, uma esperança”. Esse era o lema da Conferência de Vancouver em 1996, demonstrando o desejo de que tudo tivesse fim. Não era à toa, os números daquela época foram os mais negativos até hoje, as internações eram feitas em corredores e recepções dos hospitais e as perspectivas não eram das mais otimistas. Então: FIAT LUX! O mundo foi apresentado a uma estratégia de combate ao HIV, o coquetel, que se mostrava eficaz e aparentemente segura. Parecia o fim da terceira guerra mundial, tamanho o regozijo entre todos nós. E, festejando o fim do pesadelo, passamos a lutar pelo acesso a tal maravilha, a aprofundar questões relacionadas aos direitos humanos e... Esquecemos da cura. E não fomos somente nós, por outros motivos os laboratórios e os investidores também deixaram de lado a solução definitiva e passaram a destinar recursos para o controle da doença, muito lucrativa. Já não havia tanta pressa assim. Afinal, a AIDS tinha se tornado crônica.


Li a frase em 2008 pela primeira vez nesta década, em uma apresentação de teatro da Rede de Pessoas com HIV de Jundiaí, Ao final da peça era descerrada uma faixa com o que surpreendeu a todos por ser o óbvio: O MUNDO TEM PRESSA NA CURA DA AIDS, Como pudemos esquecer disso? Desde então alguns ativistas tornaram essa uma bandeira prioritária de luta e manifestações foram feitas nesse sentido, como no Congresso da Sociedade Brasileira de Infectologia em Goiânia. Agora vem Viena, traz à luz da sociedade algumas promissoras perspectivas nesse sentido e parece que o mundo lembrou, também, que a humanidade não pode conviver com a AIDS, ainda mais com a crescente complexidade que ela vem apresentando. O que falta, para variar, é dinheiro e falta de vontade corporativa. Que avancem as pesquisas em tratamentos, mas que se volte a investir maciçamente em pesquisas para que seja garantido nosso maior direito: o Direito à Cura da AIDS!


Soem as vuvuzelas!!! Tenho AIDS, tenho pressa! A CURA me interessa!

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O PULSO AINDA PULSA

Descrição da imagem: visão em primeira pessoa de uma estrada que leva a um lugar ensolarado, mas ainda sob forte tormenta representada pelas nuvens escuras que pairam ameaçadoras.

Foto: apenasfrases.blogspot.com

Ontem pela manhã, mal refeito da maratona Reatech, a maior feira de equipamentos e tecnologias inclusivas para pessoas com deficiência da América Latina, recebi uma péssima notícia pelo Facebook: um amigo de Sampa teria seu pé amputado. Como? Semana passada havíamos comemorado sua última sessão de quimioterapia para combater um câncer que ainda não se sabe de onde veio e as perspectivas eram as melhores! Pois uma trombose decorrente do tratamento havia obstruído as finas artérias do pé e não seria possível preservá-lo. E meu amigo, matriculado no serviço público de tratamento em AIDS, na oncologia de um renomado hospital, agora está pensando em como encarar mais esse desafio de paciência e perseverança que é uma reabilitação para minimizar os impactos de uma deficiência física.

Um tanto angustiado, subi a serra logo após o almoço e após uma pequena espera fui autorizado a entrar na UTI, onde finalmente cheguei a seu leito. Muito magro, fios por todo lado (brincamos sobre sua noção de conectividade), o pé em questão coberto pelo lençol e.... O brilho no olhar! Ele estava lá, ainda que um pouco ofuscado por uma situação extrema para qualquer ser humano, mas estava lá. E era o brilho de uma pessoa que, cortejada pela Morte, insiste em sua relação com a Vida. Isso acalmou meu coração uma barbaridade, o princípio ativo estava mais ativo que nunca e a conversa transcorreu em clima de resignação e otimismo. Mas na hora da despedida não conseguimos evitar uma troca de olhares mais turvos, preocupados com o que virá amanhã.

Voltei para casa bastante abatido, fazia muito tempo que uma situação alheia não me atingia tão duramente Nem tanto pelo episódio de meu amigo, tenho certeza que ele irá superar isso tudo de forma gloriosa. Mas onde iremos parar? Os cortejos mortais têm sido cada vez mais assertivos e qualquer hora dessas não será possível resistir. Por mais que os nervos sejam de aço, a carne é fraca. Primeiro foram as oportunistas, que ceifaram muita gente querida. Aí veio a lipodistrofia, mostrando no espelho que a ameaça ainda estava por perto. Danos ósseos, problemas cardiovasculares, hepáticos, renais, tumores, hanseníase, alterações metabólicas, deficiência e demência. Dentro de pouco tempo nosso prontuário médico mais parecerá a letra de Arnaldo Antunes, da qual pincei o título deste desabafo. Música que, apesar de elencar tudo que é doença, enfatiza que o pulso ainda pulsa.

E enquanto houver pulso, há Vida.

Beto Volpe

terça-feira, 12 de abril de 2011

No mundo da Lua

Descrição da imagem: manchete de jornal americano 'Man Enters Space' (o homen entra no espaço).

Há exatos 50 anos o homem finalmente rompia a barreira que o separava da Lua e das estrelas: Yuri Gagarin fazia o primeiro vôo orbital sobre a Terra ganhando, além de um grande trunfo para a União Soviética na corrida espacial, um admirador com apenas cinco meses de vida intra uterina., onde não existia o azul por ele visto. Oito anos mais tarde Neil Armstrong dava o primeiro passo da humanidade em solo lunar, pendendo a corrida para os americanos e conquistando uma entre milhões de crianças que, absolutamente deslumbradas, tinham sua vocação determinada: ser astronauta. Era verdadeiramente encantador ver o mundo como uma esfera solta no Universo, condenando a raça humana ao convívio entre diferenças, à sobrevivência sem subterfúgios e ao amor sem conveniências.

Claro, não pensei nisso tudo àquela época, mas a sensação de que somos membros de uma só civilização virou certeza, assim como o Fiat Lux passou a ser Big Bang e Adão & Eva uma inspiração para meus futuros pecados. Julio Verne reforçou essa crença de que somos todos iguais perante a Deus e ao DNA e os Secos & Molhados deram o start para a loucura, enchendo minha cabeça de vermes da Lua Cheia. Devorava os livros de astronomia, mas me preocupava minha pouca afinidade com matemática e física. Mas ainda alimentava o sonho de ser astronauta e, apesar de já ser bulinado há tempos (nos diversos sentidos possíveis, incluindo bulling), ver a Terra com espaço para todo o mundo.

Daí em diante a Vida encarregou-se de destruir meus sonhos de astronauta. Meus temores educacionais se concretizaram e tomei o rumo da comunicação, essa sim uma afinidade que carrego no tal DNA. Com muita tristeza vi que meus pés jamais sairiam da Terra e foi aí que decidi que jamais tiraria minha cabeça da Lua, conhecendo Janis, Rita e Raul. E o mundo gritou que não era um só batendo, literalmente, à minha cara com a afirmação de minha sexualidade. Naquela época não se batia com lâmpadas, mas ficou bem claro para mim que o mundo não era universal e que eu fazia parte da banda que não era aceita.

Das duas tristezas a maior, sem dúvida, foi a de não pertencer ao mundo. Eu sabia que, mesmo estando tão distante da Lua e das estrelas, eu continuava pertencendo ao Universo e às suas Leis Naturais. Ao passo que, em um mundo norteado pela conveniência e pelos subterfúgios, a convivência social torna-se bem complicada. Ainda bem que eu decidi continuar com a cabeça no mundo da Lua, mas com os pés bem fincados no chão. Almejar um mundo melhor sem perder a consciência de que vivemos em um ambiente degradado sob todos os aspectos. Sim, a maioria é boa mas é silenciosa e entregue à inércia. Assim como Gagarim quando orbitou a atmosfera terrestre em sua Vostok.

A diferença é que ele tinha as melhores expectativas para seu planeta, ao passo que as nossas parecem cada vez mais próximas de um buraco negro.

Beto Volpe

sexta-feira, 1 de abril de 2011

PRIMEIRO DE ABRIL !!!

Descrição da imagem: desenho de jovem jornaleiro empunhando exemplar de jornal com a manchete "EXTRA".



Causou-me surpresa a declaração de hoje do deputado federal Jair 'Tudo de Ruim" Bolsonaro onde o mesmo se desculpa por suas recentes declarações contra negros, mulheres, gays e pelo menosprezo ao movmento LGBT. Ao final da nota ele diz que faltou com a verdade ao declarar admiração pelos generais presidentes do período da ditadura e que gosta mesmo é de um bom pagodão de laje, junto com a comunidade.

Foi, finalmente, normalizdo o acesso aos sites e listas de discussão relacionados à luta contra a AIDS que haviam travado devido à intensa repercussão a mais um episódio de desabastecimento de medicamentos do coquetel, com representações de todo o país se posicionando e tomando atitudes propositivas, mantendo a bela tradição do movimento de luta contra a AIDS de combatividade e de resultados magníficos. O incalculável número de mensagens e e-mails motivou a paralisação dos servidores.


Outra excelente notícia: a Convenção das Nações Unidas pelos Direitos das Pessoas com Deficiência foi, enfim, regulamentada no Brasil, abrindo caminho para a plena cidadania das pessoas com deficiências e colocando o país em um patamar bastante elevado perante a comunidade internacional. Para que esse fato histórico tenha sido possível foi fundamenal a participação proativa de José Sarney, tradicional aliado pelos plenos direitos das PcD, junto ao Congresso Nacional que, como sempre, respondeu prontamente ao clamor social.

É mesmo um dia iliuminado. O Departamento Nacional DST/AIDS/Hepatites Virais do Ministério da Saúde declarou en reunião junto à sociedade civil, à qual estive presente a convite do próprio Ministério, que um Grupo de Trabalho formado por diversas áreas do Ministério da Saúde e de laboratórios farmacêuticos está elaborando para daqui a um mês um diagnóstico sobre o fluxo de compra e distribuição de remédios. E que, com base nos resultados será possível identificar os pontos críticos desse processo e evitar futuros desabastecimentos do coquetel.

Doutor Greco, as pessoas pelas quais eu falei ontem na reunião, aquelas que já se deitaram com a Morte, que carregam no corpo as cicatrizes da AIDS e que estão sempre em situação limite no que diz respeito a resistência viral e combinação de medicamentos, esperamos que não seja mais um primeiro de abril, como os parágrafos anteriores e também experiências anteriores quando o assunto é assistência farmacêutica. Reafirmo minha empatia e crença nos nobres objetivos de sua pessoa e de seu adjunto, pessoa que me é referência em muitos aspectos. Mas a Vida das pessoas com AIDS tem mais primeiros de abril do que primeiros de dezembro e o doutor assumiu, junto com seu cargo, todas essas nossas histórias de dor, superação e expectativas em tempos mais tranquilos.