Não, a frase não pertence a este que escreve estas linhas e que muito a proferiu enquanto integrante da sociedade civil organizada em Aids. O comentário, que mais parece um grito de alerta, foi feito no mês de outubro pelo doutor Dirceu Greco, diretor do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, durante a Assembleia Nacional das Pastorais da Aids no Rio Grande do Sul. O fato teve pouca repercussão, até porque não é segredo para ninguém que estamos perdendo conquistas históricas, muito pela letargia da sociedade civil. Porém, no dia 15 de novembro em Vitória da Conquista-BA, o Diretor da Unaids (Programa Conjunto das Nações Unidas para o HIV e Aids) no Brasil, doutor Pedro Chequer, repetiu textualmente o lamento, “o movimento de luta contra a Aids está meio acomodado”, para uma audiência de pessoas vivendo com HIV, eu incluído.
Regredi imediatamente no tempo e me senti no dia que tomei o maior ‘pito’ do diretor da escola primária na frente de meus amiguinhos. Não sabia direito para onde olhar e fiquei com medo de que minha mãe ficasse sabendo, castigo na certa. E nesse temor infantil eu me vi novamente em Vitória da Conquista e o diretor ainda estava à minha frente. Mas era o diretor de um órgão da ONU a subentender que, caso a situação não seja revista e revertida, outras perdas virão se juntar a um futuro que já antevemos repleto de surpresas. E olhem que a situação presente já é de arrepiar: nossos Planos de Ações e Metas não estão sendo executados, acumulando mais de R$ 154 milhões nos cofres públicos (O Estado de S.Paulo 24/11/10), os efeitos colaterais estão muito, muito longe de terem respostas satisfatórias e a enorme mortalidade que, segundo estudos recentes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Folha de S.Paulo 03/08/10), seria o dobro da anunciada oficialmente. Muito do tempo e energia dos ativistas são dedicados às capacitações e projetos de sustentabilidade, relegando para segundo plano um efetivo controle social para que esses desafios sejam superados ou minimizados, como o foi no início do movimento. Outros fatores também contribuem para que a reação do movimento social esteja aquém das expectativas, agora também do governo. Um deles é o senso cada vez mais comum de que a luta contra a Aids é um plano de carreira, onde a pessoa inicia como voluntário, passa a diretor de alguma ONG ou rede, de alguma instância colegiada para, enfim, conquistar seu lugar no espaço governamental, onde ‘poderá fazer a diferença’.
Como ‘bater’ (jargão do movimento) no futuro patrão?
Sem dúvida que a presença de ativistas nos quadros governamentais faz bem à saúde pública, mas quando ela se configura como objetivo passa a ser nefasta. E, seguindo a mesma lógica, como ‘bater’ no parceiro? Boa parte do ‘sucesso’ da estratégia brasileira é devida à parceria entre a sociedade civil e o governo, mas o ponto de equilíbrio dessa relação foi perdido em algum momento e parece que o movimento social de luta contra a Aids desenvolveu a Síndrome de Estocolmo pelo Estado. As pessoas que lá estão são nossos amigos e amigas, temos carinho por boa parte deles e delas e, com isso, uma pertinente vuvuzelada contra a vergonhosa falta de medicamentos passa a ser uma ofensa na opinião de membros da gestão e de parte do movimento.Enquanto escrevia essas mal digeridas linhas, já sob as influências de Sagitário, uma repórter da Agência de Notícias da Aids, me ligou para repercutir a fala do diretor da UNAIDS durante a divulgação anual dos dados do órgão sobre a epidemia, onde o mesmo repetiu, agora para o mundo inteiro saber, que falta controle social para as políticas públicas em Aids. Há tempos uns poucos ativistas são considerados radicais ou mesmo mal educados quando insistem que a força do ativismo de conquistas é a mola propulsora de qualquer movimento social.
Agora não há mais jeito nem desculpas. De repente, os gestores não conseguem mais se conter e passam a fazer um ativismo governamental para impulsionar a luta contra a Aids. Sinal dos tempos. Dá saudades da escola primária, onde o vexame era esquecido rapidamente e o castigo era apenas a privação de alguma diversão.
Hoje o vexame é inesquecível, já que a pena é capital.
Beto Volpe
Oi, Beto!
ResponderExcluirGostei da introdução de seu blog.
Vou recomendá-lo, viu!
beijos.
Parabéns por mais essa iniciativa!
ResponderExcluirÉ sempre bom fazer despertar a águia que temos em nós. É preciso olhar com mais atenção as coisas à nossa volta, cuidar e zelar de nós, de nosos parceiros, de nossos companheiros, de nossos amigos.
Abraços. Ruy.
Parabéns, muito bem colocado o alerta! Vale uma reflexão!
ResponderExcluirE repensar os movimentos sociais!
Parabéns meu querido! tenho orgulho de acompanhar esta nova ferramenta da informação, valeuuuuuuu!
ResponderExcluirQue nós ativista nos sentimos mais forte por mais
que seja o surgimento de novas mídias em pauta, a EPIDEMIA DE HIV/AIDS.PARABÉNS!
ISRAEL SILVA(RIO DE JANEIRO)