Algo está errado na mortalidade em AIDS no Brasil. Contrastando com os números oficiais, somos cada vez mais soropositivos vitimados por causas não incluídas nesse balanço, que vão desde infartos até cânceres. Gritamos isso há anos através de manifestações, cobranças em espaços de articulação e nossa voz sempre perdida no mundo tecnocrático. Recentes estudos, publicados pela Folha.com, demonstram que a percepção das pessoas vivendo com HIV antecede a epidemiologia. E que a Integralidade do SUS ainda é um sonho distante pois muitas vezes somos tratados como um punhado de vírus e não um complexo conjunto de valores, sentimentos e necessidades. Enfim, vai-se o mito da queda da mortalidade em AIDS. E agora?
Quando o coquetel apareceu em 1996 respiramos aliviados, o pesadelo havia se transformado em um sonho de perspectivas. Voltamos a esperar da vida, o melhor. Não durou muito e a realidade bateu literalmente à nossa cara com a violência da lipodistrofia, efeito colateral de nova geração. Desde então começamos a questionar a situação e a resposta era sempre a mesma: ‘falar em efeito colateral prejudica o tratamento’. Aí nossos ossos começaram a apodrecer, pâncreas e corações a dar sinais de exaustão e nosso corpo a se voltar contra nós mesmos através de cânceres em circunstâncias inéditas. Estávamos novamente com medo e nem assim tivemos um olhar mais cuidadoso para nossos gritos. O pesadelo havia retornado.
Agora um estudo da UFRJ e outro apresentado em Viena comprovam que estamos morrendo mais de outros fatores do que de AIDS. O número de óbitos por problemas no coração, rins, diabetes e cânceres subiu 8% ao ano entre pessoas com HIV e menos de 3% entre soronegativos. Com relação aos problemas cardíacos são 8% contra apenas 0,3%. Em outras palavras, cai por terra o simplismo de que estaríamos apenas envelhecendo. Sim, nossos espelhos e prontuários já sabem disso há tempos, mas estamos envelhecendo mais rapidamente. E o que confere características de pesadelo a essa realidade é que o SUS não está preparado para atender à integralidade exigida. Se 33% são identificados como pacientes sob alto risco de acidentes cardiovasculares, 66% não estão tratando seus fatores.
"Estamos começando a conhecer os efeitos do vírus e dos remédios a longo prazo. Agora precisamos nos adaptar a isso". O que o infectologista Dr. Esper Kallas da USP revela é a situação que atravessamos há muito tempo, negligenciada tanto pelo governo como pela sociedade civil, que poderia ter feito muito mais sobre o assunto. Se o Brasil replica os dados do Hospital da UFRJ, onde as mortes por outras complicações superam as por AIDS, seriam mais de 11.000 mortes anuais não contabilizadas. Como reagiremos a esses novos dados? Quantas mortes serão necessárias para acordar o mundo para a verdadeira realidade das pessoas com HIV? Porque da falsa realidade estamos fartos. Cansamos de ver nossos amigos e amigas morrendo na invisibilidade. Com a palavra, a estratégia brasileira de luta contra a AIDS.
Beto Volpe
Quando o coquetel apareceu em 1996 respiramos aliviados, o pesadelo havia se transformado em um sonho de perspectivas. Voltamos a esperar da vida, o melhor. Não durou muito e a realidade bateu literalmente à nossa cara com a violência da lipodistrofia, efeito colateral de nova geração. Desde então começamos a questionar a situação e a resposta era sempre a mesma: ‘falar em efeito colateral prejudica o tratamento’. Aí nossos ossos começaram a apodrecer, pâncreas e corações a dar sinais de exaustão e nosso corpo a se voltar contra nós mesmos através de cânceres em circunstâncias inéditas. Estávamos novamente com medo e nem assim tivemos um olhar mais cuidadoso para nossos gritos. O pesadelo havia retornado.
Agora um estudo da UFRJ e outro apresentado em Viena comprovam que estamos morrendo mais de outros fatores do que de AIDS. O número de óbitos por problemas no coração, rins, diabetes e cânceres subiu 8% ao ano entre pessoas com HIV e menos de 3% entre soronegativos. Com relação aos problemas cardíacos são 8% contra apenas 0,3%. Em outras palavras, cai por terra o simplismo de que estaríamos apenas envelhecendo. Sim, nossos espelhos e prontuários já sabem disso há tempos, mas estamos envelhecendo mais rapidamente. E o que confere características de pesadelo a essa realidade é que o SUS não está preparado para atender à integralidade exigida. Se 33% são identificados como pacientes sob alto risco de acidentes cardiovasculares, 66% não estão tratando seus fatores.
"Estamos começando a conhecer os efeitos do vírus e dos remédios a longo prazo. Agora precisamos nos adaptar a isso". O que o infectologista Dr. Esper Kallas da USP revela é a situação que atravessamos há muito tempo, negligenciada tanto pelo governo como pela sociedade civil, que poderia ter feito muito mais sobre o assunto. Se o Brasil replica os dados do Hospital da UFRJ, onde as mortes por outras complicações superam as por AIDS, seriam mais de 11.000 mortes anuais não contabilizadas. Como reagiremos a esses novos dados? Quantas mortes serão necessárias para acordar o mundo para a verdadeira realidade das pessoas com HIV? Porque da falsa realidade estamos fartos. Cansamos de ver nossos amigos e amigas morrendo na invisibilidade. Com a palavra, a estratégia brasileira de luta contra a AIDS.
Beto Volpe
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