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Sou muito humorado. Se bem ou mal, depende da situação...

Em 1989 o HIV invadiu meu organismo e decretou minha morte em vida. Desde então, na minha recusa em morrer antes da hora, muito aconteceu. Abuso de drogas e consequentes caminhadas à beira do abismo, perda de muitos amigos e amigas, tratamentos experimentais e o rótulo de paciente terminal aos 35 quilos de idade. Ao mesmo tempo surgiu o Santo Graal, um coquetel de medicamentos que me mantém até hoje em condições de matar um leão e um tigre por dia, de dar suporte a meus pais que se tornaram idosos nesse tempo todo e de tentar contribuir com a luta contra essa epidemia que está sob controle.



Sob controle do vírus, naturalmente.



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Beto Volpe



terça-feira, 26 de junho de 2012

O povo do futuro

Descrição da imagem: mapa do Brasil em branco com relevos de uma face, olhos, nariz e boca como uma máscara de teatro com a língua para fora, ironizando a expressão 'país do futuro', que tanto mal faz a todos.


Agora mesmo aconteceu uma situação que julgo emblemática com relação ao brasileiro, o povo do futuro. Estava eu no jardim de minha casa, absorto em pensamentos matinais, quando parou um automóvel popular avançando em dois palmos o rebaixamento da calçada de casa. O 'cidadão' que estava indo para o escritório de advocacia vizinho, saiu do carro, observou que estava irregular, olhou para mim e, com um sorriso mais que forçado, argumentou: 

- São só dois minutinhos, ok? Volto já!

Pois é, o sujeito sequer perguntou se eu planejava sair com o carro.  Ate pensei no Willy Wonka dizendo: 'Então você está indo atrás de seus direitos? Fale-me mais sobre não se importar com o dos outros.'. Ele achou mais prático justificar do que puxar o carro dois palmos à frente, onde havia espaço de sobra. Não tenho dúvidas que ele é daqueles que param em vagas reservadas para idosos ou pessoas com deficiência nas ruas, em shoppings e supermercados, sempre com o mesmo argumento dos dois minutinhos.

Será isso um traço característico do povo brasileiro? De querer levar vantagem em tudo sabendo, no fundo, que só está perpetuando a própria miséria e exclusão? Veremos este ano, em todos os rincões do Brasil varonil, o saldão do voto popular, onde a moeda pode ser o material pro puxadinho, uma colocação na máquina pública ou, simplesmente, ser amigo do Candidato de Tal e reforçar algum poder comunitário, normalmente escuso.

Também por conta desse pensamento que algumas seitas neopentecostais estão se dando tão bem ultimamente. É muito mais fácil você pagar um pedágio e ter o direito de demandar o acesso ao Trono do Senhor por uma via pavimentada de facilidades do que encarar as dificuldades e vencê-las pelo mérito, não pela quitação do carnê. Sendo assim, eu posso falar de ódio, excluir seres humanos iguais a mim (afinal, somos ou não somos todos iguais perante a Ele?), não cumprir com as obrigações familiares se eu congregar e, acima de tudo, mantiver o carnê em dia.

Dia desses estava assistindo a um dos inúmeros e intermináveis programas do apóstolo Valdemiro Santiago onde o especulador celestial, ao final de uma sessão de exorcismo, anuncia ao rebanho ali reunido que isso se devia à 'Glória do carnê em dia'. Em outras palavras, por que vou me preocupar em ser um cidadão exemplar se posso solucionar qualquer desvio de conduta subornando a Deus? E pouco importa se o Livro Sagrado diga exatamente o oposto, o que vale é a conveniência do caminho mais curto. Fazenda de 50 milhões, jatinhos e gravações comprometedoras? Bobagem, coisa de infiéis que irão arder após o Arrebatamento!

O brasileiro reclama da corrupção da classe política, mas ele é o primeiro a se colocar à venda. E se vende muito barato, se compararmos com o custo. Somos mesmo o povo do futuro, que vive comparando o Brasil a outras culturas onde a cidadania é a característica predominante e, na hora de mudar de postura, recebe um Macunaíma de frente e continua a defender piadas ofensivas e excludentes, a parar em vagas que não lhe pertencem e a votar em representantes que só irão lhe oprimir entre um abraço e um cafezinho no boteco da comunidade ou mesmo no restaurante cinco estrelas.

Tem até uma piada, que quase todo mundo conhece: Santa Paciência, a assistente de Deus desde o momento da criação, pergunta por que aquela grande porção de terra no sul do continente americano seria poupada de catástrofes naturais, ao que responde o Senhor:

- Você vai ver o povinho que eu vou botar lá...

É, Brasil, precisamos adotar o livro Chapeuzinho Vermelho para todas as séries de todos os níveis de escolaridade. O caminho mais curto é o menos sustentável e o Lobo Mau de hoje já não se esconde atrás das árvores nem se disfarça de vovozinha. Ele pouco se importa, é a cara da multidão.

Beto Volpe
 

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