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Sou muito humorado. Se bem ou mal, depende da situação...

Em 1989 o HIV invadiu meu organismo e decretou minha morte em vida. Desde então, na minha recusa em morrer antes da hora, muito aconteceu. Abuso de drogas e consequentes caminhadas à beira do abismo, perda de muitos amigos e amigas, tratamentos experimentais e o rótulo de paciente terminal aos 35 quilos de idade. Ao mesmo tempo surgiu o Santo Graal, um coquetel de medicamentos que me mantém até hoje em condições de matar um leão e um tigre por dia, de dar suporte a meus pais que se tornaram idosos nesse tempo todo e de tentar contribuir com a luta contra essa epidemia que está sob controle.



Sob controle do vírus, naturalmente.



Aproveite o blog!!!



Beto Volpe



sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

A Peste Gay Revisitada

Amigas e amigos, tenho a honra e o prazer de publicar excelente artigo de meu irmão Cláudio Monteiro que, espero, provoque as devidas e necessárias reações.
Beijos
Beto Volpe

Descrição da imagem: manchete de jornal dos anos oitenta destacando: PESTE GAY JÁ APAVORA SÃO PAULO, complementada por 'É a pior e mais terrível doença do século - dois brasileiros mortos.

A PESTE GAY REVISITADA

Cláudio C. Monteiro Jr

-Meu vizinho é gay, vocês não vão prendê-lo ?

Este foi o teor de um telefonema (a voz era feminina) por mim recebido no então recém aberto Disque-AIDS[1]. Era o ano de 1984.
A associação aids/homossexualidade era tão direta quanto a certeza de um dia após o outro. Dias difíceis.
Se por um lado o recém florescente movimento gay brasileiro viu-se vulnerabilizado por uma doença que possuía o estranho tropismo por indivíduos com determinada orientação sexual historicamente estigmatizada, por outro, diversos setores da sociedade civil, ou simplesmente o (mau) senso comum, viu na AIDS a ratificação, divina ou natural, da condenação dos gays por seus pecados e desvios “contra a natureza”. Formadores de opinião não perderam tempo em expor o seu enfático “eu não disse? bem feito!” ostentando-o arrogantemente aos humilhados “pederastas” e “sodomitas”. Dom Eugênio Salles, então arcebispo do Rio de Janeiro assim o fez, como também o fez o Prof. Dr. Ricardo Veronezzi, Infectologista da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, ao defender a hipótese pela qual a imunodepressão devia-se ao acumulo de esperma no ânus, como se o sexo anal fosse prerrogativa dos gays, e não existisse desde que existe sexo.

A primeira reação da comunidade gay mediana frente à AIDS foi de descrédito e revolta. Dizia-se que tudo não passava de uma propaganda anti-gay (a palavra homofobia não estava ainda em voga), originada ou pelo Governo Reagan, ou pela TFP[2]. A isto se somava a refratariedade do empresariado “gay” (também a designação GLS não estava ainda em voga) ao tema AIDS, alicerçada no argumento de que falar em AIDS iria espantar a clientela.
Tal foi o esforço em se desomossexualizar a AIDS, por parte dos gays, que em determinada reunião do GAPA[3], discutiu-se a conveniência ou não, de rapazes que usassem brincos, falarem publicamente em nome da entidade. E isto quando a totalidade dos membros do GAPA eram oriundos do movimento gay, ou no mínimo, gays “assumidos”.
Se os gays viram-se como vítimas, a sociedade os via como culpados. E naturalmente, houve um trauma brutal no processo de fortalecimento dos gays enquanto segmento social atuante, na busca de seus direitos fundamentais, associado a um fortalecimento também brutal da homofobia, que não teve prurido algum em fazer-se pública, como no caso do radialista Afanásio Jazadi que aconselhava seus ouvintes a não tomarem cafezinho na região do Arouche[4], ou a não usarem mesmo elevador que um gay. E isto, quando há menos de dois anos, a repressão indiscriminada aos gays integrava o conjunto de medidas moralizantes propostas pelo então Secretário da Segurança Pública de São Paulo, o famigerado Erasmo Dias.

Tal panorama se fez extremamente propício não só a disseminação da AIDS como retardou, ou antes, intimidou o desenvolvimento de ações preventivas. Desenvolver uma cultura preventiva gay foi ainda mais difícil, pois o único insumo de prevenção disponível era (como ainda o é, embora não o único) o preservativo masculino, tradicionalmente um contraceptivo. Como associá-lo a um exercício de sexualidade que nunca exigiu ações de planejamento reprodutivo? Como resultado de tal cenário labiríntico, o número de casos de AIDS entre homossexuais masculinos no estado de São Paulo, passou de 1 (em 1981) para 865 em 1989[5], ano em que a incidência de AIDS entre os Usuários de Drogas Injetáveis superou a verificada entre os gays.
Associada a exacerbante expansão da epidemia em nosso meio, verificou-se também uma profunda mudança no perfil sócio epidemiológico, num espaço de tempo pouco superior a vinte e cinco anos. A análise das taxas de incidência evidencia a presença de três momentos (ainda que sobrepostos) da epidemia: do início ao fim da década de 1980 predomínio de casos novos entre homens que fazem sexo com homens (HSH)[6]. Do início a meados da década de 1990, explosão da epidemia entre os Usuários de Drogas Injetáveis (UDI). E, a partir do início deste século, as relações heterossexuais configuram-se enquanto a principal forma de disseminação. Enquanto as curvas de tendências epidemiológicas anteriores (HSH e UDI) ascendem, atingem seus ápices e declinam (o número de casos novos entre UDI atualmente, pouco impacta a epidemia), a curva dos heterossexuais (presente como as outras, desde os anos 80), encontra-se em constante e permanente ascensão.
Porém o exame cuidadoso destes mesmos indicadores epidemiológicos evidencia o crescimento do número de casos novos de AIDS entre os HSH notadamente a partir de 2002, o que nos leva a pensar e a considerar (apesar do neologismo inadequado) que estamos em pleno processo de “reomossexualização” da epidemia. A visibilidade de tal fenômeno é tal que os órgãos governamentais responsáveis pelo enfrentamento ao HIV o admitem, e propõem ações de enfrentamento.

E, quais os fatores que levam a isto? Por que a epidemia volta a crescer entre os gays, 30 anos depois?

O que estava sendo empiricamente observado, pelo movimento de gays jovens nos serviços de HIV/AIDS teve sua confirmativa no Relatório da Seção Especial da Assembléia Geral das Nações Unidas (UNGASS), Biênio 2008/2009, sobre a resposta do governo brasileiro à epidemia de HIV/AIDS:
Observa-se uma tendência de estabilização na proporção de casos de AIDS entre HSH a partir do ano 2000. No entanto, na faixa de 13 a 24 anos, verifica-se aumento na proporção de casos de aids nesse grupo populacional que passou de 35% em 2000 para 42,7 em 2008.
Ou seja, estamos falando, em primeiro lugar de novas gerações de gays. Gays que nasceram quando a epidemia já estava banalizada em nosso meio. Banalizada e invizibilizada, pois passara de doença de Vips a doença de pobres. E os pobres só estão na mídia convertidos e desumanizados em números, por ocasiões de catástrofes e tragédias coletivas. Gays que não tiveram amigos próximos ou companheiros dizimados pela AIDS. Gays que vivem 30 anos depois.

Outro fator está na banalização do risco, associado ao falso senso comum pelo qual “AIDS agora tem remédio, se pegar se trata”, quando a realidade é bem outra: não só o HIV ainda é a maior causa de morte entre adultos jovens no mundo, como o fato de ser portador do HIV coloca o individuo em posição de vulnerabilidade ampliada para óbitos de várias naturezas, como cardiopatias e neoplasias. Isto sem mencionarmos os efeitos adversos provocados por determinados medicamentos componentes da Terapia Antirretroviral, o popular coquetel, como as lipodistrofias e osteonecroses. Contra tal postura, há ainda o argumento infalível (ainda que monetarizante) da relação custo benefício: a política de acesso universal aos antirretrovirais (louvável conquista de todos nós) impõem aos cofres públicos um custo não inferior a R$1.500,00 ao mês por usuário, ao passo que o preservativo masculino é baratíssimo (mesmo para os cofres públicos).
Se formos circunscrever a situação apontada pelo Relatório UNGASS quanto ao crescimento da epidemia entre os gays jovens numa ótica mais ampla, cujo foco seja não a orientação sexual, mas a faixa etária, (13 a 24 anos, período que inclui a adolescência), veremos que nesta situação incluem-se também as mulheres, já que, neste período, a incidência é três vezes maior entre moças do que entre rapazes, sendo a faixa etária de maior feminização da epidemia. Há ai, portanto, um primeiro desafio: o fortalecimento das ações de prevenção para adolescentes através de ações que incluam o educar para a diversidade e a quebra de paradigmas heteronormativos,

Na contramão da penosa construção de uma cultura preventiva gay surgem dois tenebrosos zumbis: Bare Backing e Sperm Cult, ou seja, a adesão espontânea, de comum acordo e consciente ao sexo anal sem preservativo; e a crença pela qual o orgasmo só se completa quando há contato íntimo (em que pese a amplitude do termo “íntimo”) com o esperma do(s) parceiro(s). E como zumbis eficientes, estes assombram não somente os dark rooms das saunas e boites, os sex clubs, banheiros e cinemas pornôs, mas também os leitos de vários casais gays respeitáveis e “descentes”. E o terreno é extremante fértil a ambas aparições, pois o mercado sexográfico gay encontra-se sempre em expansão e diversificação, vindo a, obviamente, expandir o número de clientes.
Voltando-se o foco de nossa análise para a atual política de financiamento das ações de prevenção, pautada na premissa municipalista do Sistema Único de Saúde, esta prevê o repasse, do Fundo Nacional aos Fundos Estaduais e Municipais de Saúde (26 Estados e 456 Municípios, dos quais 145 no Estado de São Paulo[7]) do total de R$ 125,7 milhões ao ano, exclusivamente destinados ao enfrentamento às DST/AIDS. Ainda que tal repasse obedeça a regras muito bem definidas, condicionadas à pactuação de metas a serem alcançadas, não há garantia nenhuma de que o recurso recebido seja destinado ao fim pactuado. E, ainda que o sistema de financiamento preveja ações de monitoramento da utilização dos recursos financeiros[8], tais dispositivos raramente são observados.
A fragilidade do sistema de financiamento quanto à real execução das metas pactuadas tem sido alvo de produções acadêmicas[9], que demonstram o quanto o descumprimento das metas vem impactando negativamente os indicadores de saúde de determinados estados e municípios, assim como tem se refletido nos indicadores epidemiológicos. Claro que tais fatores comprometem sobremaneira execução das políticas de contenção do HIV, incluindo as voltadas ao público LGBT.

A nos pautarmos pela proposição foucaultiana que nos permite lançar sobre nossa história pregressa, não um olhar linear, mas em espiral, veremos que ainda que reomossexualizada, a epidemia de AIDS é outra assim como nosso momento é outro.
E neste outro momento histórico cumpre-nos resignificar relações historicamente desiguais quanto ao empoderamento de situações, cabendo à comunidade gay tomar a vanguarda na definição das políticas prevenção e protagonizá-las, para que estas não lhe sejam, eufemisticamente, ofertadas.
Neste caso, aprender com o passado é agir. E agir de modo incisivo. Se a timidez das ações desenvolvidas no início dos anos 80 resultou na explosão da epidemia, neste outro momento histórico, ações de intervenção que antes eram capitaneadas por poucos e estóicos ativistas, passam hoje a integrar a ampla relação dos problemas contemporâneos cujo enfrentamento implica em um amplo sentido de corresponsabilidade civil e governamental.

Basta-nos tão somente a ousadia.
A ousadia de tirar a tímida camisinha do “armário”[10] e colocá-la, assumidamente, no dark room.

Cláudio C. Monteiro Jr é bacharel em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo e mestre em Infectologia em Saúde Pública pelo Instituto de Infectologia em Emílio Ribas. Atua desde 1985 no enfrentamento ao HIV, em organizações governamentais e não governamentais, sendo membro da Pastoral da AIDS, CNBB.

Tecla SAP:

[1] Serviço de informações sobre AIDS por telefone, o primeiro do país, disponibilizado pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo em 1983.
[2] Tradição, Família e Propriedade. Organização Católica ultra conservadora, apoiadora da Ditadura Militar
[3] Grupo de Apoio a Prevenção da AIDS. A primeira organização não governamental de enfrentamento a AIDS do Brasil, fundada em São Paulo, em 1985.
[4] Largo localizado na região central de São Paulo, conhecido pela presença da comunidade gay.
[5] Fonte: Programa Estadual de DST e AIDS de São Paulo
[6] Optamos por, neste caso, usar a categorização epidemiológica geral que envolve nãos somente gays, bissexuais, travestis e transsexuais, como também a pratica eventual da homossexualidade em homens privados de liberdade ou constrictos.
[7] Sobre a Instituição da Política de Financiamento : Portaria Ministério da Saúde nº 2313/02 e 2314/02
[8] Sobre o Monitoramento dos Recursos Financeiros : Portaria Ministério da Saúde nº 1.679/04.
[9] Citaremos, entre outras, as dissertações de mestrado de Silva, FL e Taglieta, M., além de nossa própria dissertação.
[10] Em algumas saunas gay, os clientes encontram preservativos nos armários guarda-roupas.

4 comentários:

  1. Bem.. inauguro entrar em blogs através de meus amigos Beto e Claúdio..Super artigo..Um filme em minha memória..Desde 1989 militando a favor de pessoas vivendo com AIDS, distante 520 km da capital, numa cidade do interior do estado de SP, com recortes provincianos...Mas o preconceito e estigmas não estão restritos aos feudos.Estão nas pequenas cidades, nas metrópoles pois estão onde o coração e a alma preconceituosa estiverem.Parabéns Claúdio.
    Vc tocou minha alma com seu artigo.
    Paz e bem.
    Léa Votuporanga

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  2. PARTE DOIS
    Em outras palavras, apenas repetir o mantra "use camisinha" hoje, para mim, se mostra insuficiente. A juventude sabe que é preciso usar - mas se abstém dela por diversos motivos, do barebacker à confiança monogâmica e ao desejo de experimentar. Não vai adiantar dizer para eles que eles são "loucos", etc., pq eles (exceção dos backers, que sublimaram qq ideia de risco) consideram que correm MENOS risco. E o problema: fazem isso sem recorrer aos serviços de prevenção e aos médicos, com medo (real) de punição. Afinal, ainda subsiste a ideia de que um casal hétero casado sem preservativo "é normal", e os héteros podem argumentar a sensível ideia de querer criar uma família. Mas o casal gay, mesmo junto há 20 anos, se se abstém do preservativo já é tachado de louco e barebacker. É CLARO que isso não vai ser mencionado em consultas médicas e afins. E, posso estar enganado, mas um casal que pensa passar a vida junto pode se unir por diversos motivos - mas usar a camisinha sempre, por toda a vida, não costuma ser um deles...
    Então, a questão é: a camisinha não deve ser abandonada e deve ser incentivada sempre. Mas CASO a pessoa ou o casal deseje se abster dela, é necessária a criação de novas barreiras e discursos para reduzir o possível dano de a infecção ocorrer. É nisso que se inserem novas estratégias (auxiliares) de prevenção, como a PreP, por exemplo, mas tb é preciso que os serviços de prevenção e os médicos estejam dispostos a ouvir sem julgamentos e aconselhar pessoas que, livres e conscientes, não querem o preservativo. Tirando a camisinha de cena (a melhor estratégia de prevenção, mas há quem vá se abster desse melhor), que outras estratégias podem ser usadas para minimizar o risco de infecção? É esta a questão. Não é a camisinha que tem de sair do armário: é o SEXO! A troca de fluidos, pois, não podemos nos esquecer, o barebacking surgiu exatamente como reação à progressiva "higienização" e "medicalização" do sexo via camisinha, dental dams, etc. Embora bem-intencionado esse segundo processo, toda ação gera uma reação - e se vc "proíbe" ou "reprime" demais, a reação é grande o suficiente e vira esse problemão que hj temos em mãos.
    Uganda foi um dos países que conseguiu reduzir as taxas de infecção do HIV não se centrando apenas na camisinha. É um país homofóbico, distante da realidade do recrudescimento que estamos enfrentando e cuja campanha tem, de minha parte, diversas críticas, a começar pela proposta de promover a abstenção sexual em detrimento do uso do preservativo. Mas, como tudo tem um lado bom, é fato que eles trouxeram uma abordagem que pode ser adaptada e interessante para os lados de cá: a pluralidade de discursos, e os passos como 'barreiras excedentes' à infecção viral.
    Em escolas inglesas, isso tem sido adotado. A famosa 'escala de risco', no caso do sexo oral. Quer 100% de proteção, chupe com preservativo. Não quer? Não deixe gozar na boca. Não quer? Não engula... E por aí vai. Quer transar? Use camisinha. Não quer? Conheça a sorologia do parceiro. Não sabe?... E daí por diante.
    Se se criar um ambiente propício e sem julgamentos com esse tipo de intervenção, para mim, a tendência é que os jovens sejam mais sinceros e os médicos e serviços de prevenção possam intervir de forma mais efetiva com base no paradigma da redução de danos.
    É preciso ser realista. Não vai adiantar muito para mudar esse quadro uma pessoa do serviço de proteção com 3 filhos (e, portanto, não usou preservativo) dizer a um gayzinho jovem que namora e confia (com razão, sem razão, se arriscando ou não) no namorado que, com ele, a camisinha é "obrigatória". E muito menos convencer a maior parte das pessoas a usar preservativos no cunete e no sexo oral. Isso, já se sabe, quase ninguém faz. Aliás, pq até hj não inventaram um preservativo sabor pau? Seria muito mais eficiente que esses de cheiro de uva, chocolate e banana para estimular o sexo oral, não?
    Essas são minhas reflexõe
    Bjs
    João Marinho

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  3. PARTE UM
    Eu concordo com quase tudo que o Cláudio colocou.
    Porém, entendo que, se estamos num novo momento, então é necessária uma nova abordagem nas políticas de prevenção.
    É verdade que a geração de jovens que nasceu no pós-Aids não vê mais a epidemia tal como ela era nos anos 80 e início dos anos 90, o bicho-papão e sentença de morte.
    Mas a meu ver apenas isso não explica o recrudescimento da Aids entre gays jovens. É um dos fatores, mas há outros, entre os quais a curiosidade natural. Os gays que têm 30, 40, 50 anos sabem como é o sexo sem camisinha (comparativamente melhor, fato). Os mais jovens querem saber também e terem uma vida sexual similar à de seus pais, que, com certeza, não usam (ou esses mesmos jovens não teriam nascido) e à de seus pares heterossexuais - que, após a adoção da pílula pela menina e o casamento, não usam também.
    Aliás, acho até que se supervaloriza essa coisa de "ah, é pq eles não viram a devastação da Aids nos anos 80". Trabalho em uma revista que trabalha com sexo e pornografia. Raros os casos que vi, na vida privada e profissional, de alguém dando de ombros e dizendo "ah, basta tomar um remédio para tratar o HIV". Só os barebackers assumidos (uso o termo de uma forma particular - vide abaixo) e olhe lá - pq existem tb diferentes tipos de backers, como acabei detectando na reportagem que estava fazendo (hj, parada, esperando a definição de quando sairá o projeto da revista) Ao contrário, o HIV ainda assusta muita gente e, embora impacte menos do que antes, ainda permanece uma dificuldade bastante presente na vida de soropositivos que tencionam, ou são levado a, entrar/procurar relacionamentos sorodiscordantes.
    Por isso é que, ao lado do "sperm cult" e do "barebacking" (que eu sempre uso como sinônimo de sexo sem preservativo com qq pessoa, por parte de quem "desistiu" da proteção em nome do prazer. Não é idêntica a situação de alguém que, em nome desse prazer, se abstém da proteção à de um casal, gay ou hétero, que decide após conversas, exames e afins... E os motivos tb não são os mesmos), existem outras formas de praticar sexo sem camisinha que os mais jovens consideram "menos" arriscada, como os namoros monogâmicos, que acabei de referir, ou grupos fechados de prática sexual. E há de se considerar que existe uma tendência em parte da juventude de hoje, detectada por veículos gays que trabalham proximamente com o sexo, de que hoje, sexualmente, essa parte tende a ser mais conservadora que a geração dos anos 70, por exemplo.
    (CONTINUA
    A questão: eu não vejo como isso vá mudar num futuro breve. Não penso que seja o caso de "tirar a camisinha do armário", pq ela saiu faz tempo - mais de 90% da população responde corretamente que ela é a melhor forma de prevenção, segundo estatísticas, embora as campanhas ainda sejam localizadas temporalmente e por isso deficientes. A questão é analisar mais de perto essa "negociação de risco" que a juventude gay faz e procurar abordá-la numa perspectiva de redução de danos, que, por sinal, tão certo deu com os UDIs nos anos 90.

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  4. Meninos, eu ponderaria algumas coisas, dentro do qeu os dois colocaram:
    - sim, é frequente a afirmação de que 'hoje tem tratamento' como atenuante dos riscos. Em minha cidade, praiana com a consequente exposição física, tem um monte de bills de minha época ou mais jovens que passaram a se cuidar, frequentar academia, etc.... e servem de 'referência' para essa idéia.
    - acho super exitosas as ações de RD, aliás, acredito na RD como filosofia de vida, ainda mais em tempos bicudos, onde frequentemente ficamos entre a cruz e a caldeirinha. Quanto à migração de infetáveis para o crack, sem dúvida, como sem dúvida é a falta de ações de RD para esse público, articulados com a saúde mental. Isso está acontecendo em cinco municípios da baixada santista, capitaneados por são vicente, onde os serviços de dst/aids e saude mental mais usuários e sociedade civil articulados estão mapeando e establecendo metas e ações em conjunto.
    - quanto ao bare... sim, tb acho que é pra qq tipo de sexo deliberadamente sem proteção. Acho um puta risco se falar em grupos monogâmicos, sendo que monogamia é difícil entre duas pessoas, o que dirá entre 'x'? E tenho ouvido um recorrente discurso banalizando as festas de barecacking, sempre proscritas por sua natureza, hoje citadas simplesmente como 'festinha bare'...
    Amei a camisinha sabor pau. Falta variar as etnias, agora... hehehe

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